quinta-feira, 19 de outubro de 2017

NOVO PRÊMIO NOBEL PARA A ECONOMIA COMPORTAMENTAL

NOVO NOBEL PARA A ECONOMIA COMPORTAMENTAL

Confesso que não me causou qualquer surpresa a indicação de um economista da Escola Comportamental novamente para o Prêmio Nobel de economia.

A economia comportamental é um ramo da economia que não trata da economia propriamente dita, mas sim do comportamento dos agentes econômicos, “procurando dar destaque e primazia aos fatores psicológicos dos agentes econômicos, como determinantes das diversas variáveis e aspectos da atividade econômica, notadamente a importância para os aspectos conjunturais da economia e seus ciclos” (Um Raio X sobre “O espírito animal”, neste site). 

Outrossim, procuram enfatizar que os agentes econômicos não se comportam tão racionalmente quanto se supunha em relação ao “homo economicus”, fundamento de toda a economia clássica.

Ora, há muito, todos sabemos que o “homo economicus” foi uma construção ideológica (no sentido marxista) que serviu para vestir a também ideológica economia clássica.

No meu primeiro artigo sobre economia, “Direito, economia e mercados racionais – uma crítica aos economistas racionais”, abordei este assunto da irracionalidade sob um ponto de vista histórico, freudiano (psicanalítico) e, de uma forma bastante superficial, da neurociência.

Também comentei sobre “O paradoxo da mão invisível e dos mercados racionais”, com uma crítica sobre “A racionalidade dos economistas racionais” e como esta teoria caminhava em contramão com a “realidade” e o Direito, “indo de encontro aos princípios jurídicos mais elementares que estão em consonância com as vicissitudes e as necessidades das sociedades atuais”.  

Posteriormente, postei um outro artigo intitulado “Um raio X sobre o “Espírito animal””, em referência ao livro de George A. Akderlof e de Robert J. Shiller, agraciados com o Prêmio Nobel de economia em 2001, que por sinal, distorceram Keynes ao plagiarem a sua expressão. 

Ora, que o comportamento humano não é racional, no sentido em que estes economistas queriam dar, já bem sabiam os escritores, mormente os romancistas. 

Pode parecer estranho, mas poderíamos até dizer que Freud não descobriu o inconsciente, e sim procurou aflorar o inconsciente, trazê-lo à “razão”, através do método " livre associação", que pode e foi questionado.

Também bem o demonstrou o behaviorismo, com Pavlov e as suas experiências em cães sobre reflexo condicionado, com fundamento na mecânica clássica, estímulo - resposta.   

E não podemos esquecer a importância que a propagada assumiu nas opções e decisões dos agentes econômicos, há décadas, evoluindo para a propaganda subliminar. Deixar de levá-la em consideração seria admitir que os empresários são idiotas e gostam de gastar milhões sem que tenham quaisquer retornos e proveitos econômicos e financeiros. 

Pascal (1623-1662) matemático, físico e filósofo francês já afirmara que “O coração tem razões que a própria razão desconhece”, frase que a criatividade musical dos brasileiros levou-o para a música popular: “Aos pés da Santa Cruz/ você se ajoelhou/ e em nome de Jesus/ um grande amor você jurou/jurou, mas não cumpriu/ fingiu e me enganou/pra mi você mentiu/pra Deus você pecou/ o coração tem razões que a própria razão desconhece/ faz promessas e juras/ depois esquece ...”.

De Pascal também encontramos: “O último esforço da razão é reconhecer que existe uma infinidade de coisas que a ultrapassam”.

E Marx dizia que não podemos acreditar no que um homem diz de si.

Em 2006, Japiassú de forma bastante elegante afirmava que "O desafio da razão é o de tentar explicar tão racionalmente quanto possível a desrazão e o irracional, inseparáveis dos comportamentos humanos" (em "Como nasceu a ciência moderna)

O que estes economistas comportamentais ainda não entenderam, ou não querem, é que a comprovação do comportamento “não racional” do ser humano serviu apenas para jogar por terra a teoria “dos mercados racionais e perfeitos”, fundamentada no pressuposto ideológico do “homo economicus”. 

Este reconhecimento não passa disto e não serve para explicar as leis que regem a economia capitalista. Tratam-se apenas de escolhas individuais racionais que no conjunto tornam-se irracionais. É isto que nos ensina a dialética: "o todo não é a soma das partes".  

Até ajudam a esclarecer certos pontos sobre o comportamento em manada e outros, que aceleram e aprofundam as crises, mas não servem para explicar as crises. É comum os dirigentes governamentais dizerem que a crise é “de confiança”. Ver comentários no artigo "Um Raio X sobre o "Espírito animal"", neste blog. 

Mas, estes comportamentos irracionais ou racionais, não conseguem explicar a crise de demanda efetiva, elaborada por Keynes e Kalecki, nem as crises financeiras de Minsky. Não conseguem explicar porque o mercado financeiro se descola do mercado “real”, de bens, etc. E isto independe dos comportamentos racionais, irracionais, neurais, genéticos do ser humano.

Com estas teorias pretendem substituir as leis intrínsecas e instáveis da economia capitalista, que cominam em crises econômicas, pelo comportamento irracional dos agentes socioeconômicos. Agora, as crises da economia têm fundamentos nos comportamentais irracionais do ser humano. 

Não dão importância a “financeirização” da economia, as suas razões políticas, sociais e econômicas, a “concentração e centralização” do capital, analisadas por Marx, a “internacionalização das etapas dos processos produtivos”, o "poder econômico, político e financeiro das empresas multinacionais" e as "relações de poder" (que permeiam as relações socioeconômicas), que tanto distorcem, modificam e dificultam a regulação das economias.

Tampouco se importam como estas relações repercutem nas nações subdesenvolvidas, agravando os seus problemas sociais,  mormente a fome. 

Os economistas, mais precisamente por uma questão da relação poder-saber, ou quem sabe até por uma "razão que a própria razão desconhece", sempre pretenderam fazer da economia o pilar da sociedade, relegando a política para um segundo plano. De um modo geral os engenheiros e cientistas não têm tanta atração pela mídia e não dão IBOP.  E eis o paradoxo: quanto mais discordam mais interessantes se tornam. Lembrem-se de Irving Fisher e os seus conselhos que o levaram à falência nos idos de 1929 (Consultar "1929" de Ivan Santana). 

Para a felicidade da grande maioria dos economistas, o regozijo veio quando nas eleições de 1992 o candidato Bill Clinton usou a expressão "It's the economy, stupid", para vencer o seu oposicionista.

Em recente artigo postado neste blog, "Obstáculos socioculturais ao desenvolvimento econômico", comentários sobre Ha-Joon Chang, afirmei:

"A ideia de que a economia é o alicerce ou a infraestrutura da sociedade não ajuda a clarear a situação. Isto porque nos traz a conotação de que primeiro seria necessário implementar as medidas econômicas para posteriormente construirmos o arcabouço institucional, legal, político, ideológico, educacional (científico e tecnológico). Não estamos a falar de engenharia e construção de prédios".

Por trás disso tudo existe sempre uma questão política e ideológica, que seria desfocar e despolitizar. Quem sabe a sociedade capitalista "precisa" sobreviver e todas sociedades trazem suas próprias ideologias. Mas, não precisavam exagerar. Não precisam divulgar falsamente e de forma tão acintosa o que elas não podem fazer.  

Ficam neste joguinho de pingue-pongue, bolinha para lá, bolinha para cá, sem qualquer contribuição digna de um Prêmio Nobel.

Quando olho para estes Prêmios Nobel de Economia não consigo deixar de lembrar e pensar nos economistas que advogavam a “teoria dos mercados perfeitos e racionais”, já de muito descreditadas, que foram agraciados com o Prêmio Nobel, sob o lobby da Universidade de Chicago. E pelo visto ela continua ativa. E com esta grande teoria contribuíram para a crise de 2007. E quanto as responsabilidades? Nada. 

Ora, isto nos leva a questão do saber-poder em nossa sociedade, tão bem analisada por Japiassú em “O nascimento da ciência moderna” e “O mito da neutralidade científica”, e explorada por mim no artigo “Modelos matemáticos – porque eles falham”, postado neste blog.

Meu Deus! Quanta inutilidade sobre um assunto comportamental que já não tem tanta importância sobre a sua repercussão na economia e que são melhores explorados pela neurociência, a genética e a psicanálise. Foi-se. 

E me vem sempre o pergunta: porque o berço dessas "anomalias teóricas" são sempre os Estados Unidos?

Há muito que os economistas não contribuem com algo importante. estão alheios aos acontecimentos e contribuições mais avançadas das outras ciências. Vivem da vaidade, formulando modelos matemáticos sofisticados sem qualquer vínculo com a realidade e dando opiniões na mídia sobre os mercados financeiros. Agora, surge um novo ramo da economia que é totalmente improdutivo se comparado às contribuições de outros ramos científicos.

No artigo "A crise de 2008 e as informações assimétricas", mais especificamente no tópico "A ideologia e seus efeitos funestos" assim me expressei:

"Causa espanto como pessoas tão inteligentes, capazes de elaborar modelos econométricos sofisticadíssimos, se ocupam de coisas tão infrutíferas e irreais". E se rendem aos argumentos mais simplórios, que o ser humano mais humilde ignora. 

Fico imaginando o custo social de tudo isto. Afinal, onde encontramos a eficácia da alocação dos recursos na economia capitalista, que tanto, "repetidamente", nos ensinaram? Ao que tudo indica trata-se de mais uma ideologia.

Conforme afirmei no início deste artigo, não me causou surpresa a indicação de um Nobel para um economista comportamental. Mas, sim, ainda me causa espanto, tanto irracionalidade dos economistas e de seus fieis seguidores. Infelizmente, a economia já vive há algum tempo de modismos e este é mais um.

Entretanto, acredito ser dever de qualquer um procurar as raízes de tantas irracionalidades, principalmente num momento de crise em que os recursos se tornaram mais escassos e os governos não se cansam de anunciar e propagar cortes em programas sociais, em nome de uma melhor alocação de recursos, enfim, da eficiência.Tudo um farsa. 

Sobre o comportamento humano e sua "irracionalidade" e a importância da neurociência sugiro aos leitores interessados três livros bastante interessantes, os dois primeiros bem accessíveis: 

- "Subliminar - como o inconsciente influencia nossas vidas",  de Leonard Mlodinov, Zahar;

- " O Cérebro - a descoberta de quem somos", de David Eagleman, Ed. Lua de Mel;

- Neuro economia - ensaio sobre a sociobiologia do comportamento", de José Eduardo Carvalho, Edições Sílabo. 

E para os estudantes de economia sugiro que parem de ler estes economistas comportamentais. Com certeza darão um grande passo e sobrará mais tempo para se dedicarem ao que interessa. 

Obs: em breve pretendo acrescentar num Apêndice algumas frases do livro "O cérebro", que acredito serão muito úteis aos leitores.  

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