domingo, 22 de outubro de 2017

A INDIGNAÇÃO NÃO SUBSTITUI A LEI - Quem pode o mais pode o menos

A INDIGNAÇÃO NÃO SUBSTITUI A LEI
(“quem pode o mais pode o menos”)

É bem verdade que a sociedade brasileira se encontra perplexa e indignada, sinais de uma crise moral profunda, plenamente percebível com as investigações da Lava Jato e as respectivas repercussões jurídicas.

Encontra-se em xeque os valores morais, bem como o arcabouço valorativo das normas jurídicas, a hermenêutica jurídica. Devemos interpretar as normas jurídicas de acordo com uma nova valorização, sob um novo prisma, esquecendo e jogando para a lata do lixo tudo o que foi construído, os seus alicerces? Não penso que sim e acredito que muito do que foi feito permanece de pé.  

Mais uma vez em nossa história os acontecimentos têm trazido uma quantidade infinita de problemas nunca antes vivenciados, que repercutem tanto a nível social quanto político e jurisprudencial. Infelizmente é a nossa história.

Após a desilusão com a esquerda, que nunca foi esquerda, assistimos os mais diversos pronunciamentos radicais, que nos chegam através do Facebook e outros meios de comunicação, pregando abertamente uma ruptura total com ordem social estabelecida. Outros dentro de uma legalidade se posicionam a favor de uma direita, bem à direita. Pelo menos são mais prudentes e sensatos.

Mais uma vez a imprensa não ajuda e confunde os cidadãos. Muitos “fazedores de opiniões” estão no mesmo nível do cidadão comum e alimentam esperanças irreais, além de não procurarem esclarecimentos com pessoas que estão mais afinadas com os temas jurídicos e outros. 

Quanta confusão. Não deixa de ser verdade que os fatos tomaram proporções gigantescas e por isso as pessoas afrontadas em suas dignidades, com tantos escândalos, propõem medidas extraordinárias de regulação social, com lembranças de um passado não tão distante, mas que também foi superado pelas forças sociais, por não atenderem aos princípios que regem a sociedade moderna.

Talvez, por isto a nossa Constituição foi tão detalhista, se preocupando com os direitos e garantias individuais, alinhada com a defesa dos princípios democráticos, ínsitas no Texto Constitucional, mormente nos seus artigos 5º e 6º.

Em princípio resta saber se “restabelecer” uma ordem social que vigorou durante quase três décadas e que foi substituída por uma nova seria suficiente para fazer brotar as esperanças dos agentes sociais.

É lógico e bem sei disto que uma transformação social desta envergadura geralmente não se dá através de razoabilidades e debates, mas através da força.

Diante de tanto incerteza e descrença mudo a minha visão histórica e consigo ver a grandeza do gesto de Getúlio.

A crise também bateu nas portas da “justiça”, com decisões que não agradam aos radicais, aos democratas e todos os demais espectros sociais. Mas, a meu ver, muitas decisões não colocam em xeque os princípios que regem a interpretação das normas jurídicas.

Particularmente creio que não existe espaço para um regime de força.

Entretanto, o propósito deste artigo não é apontar soluções para problemas tão complexos, mas expor minha opinião sobre algumas decisões jurisprudenciais, mormente do Supremo Tribunal Federal. 

Para isto me socorri de um artigo postado pela Conjur, por Vladimir Passos de Freitas, que o leitor poderá encontrar em Conjur – Segunda Leitura: os poucos conhecidos e lembrados brocardos jurídicos, https://www.conjur.com .br.

Este artigo trata especificamente da importância dos brocardos jurídicos, que assim como os princípios constitucionais norteiam as decisões jurídicas.

Permitam-me reproduzir algumas passagens para situar bem o leitor no que eles representam:

“Os brocardos jurídicos, também chamados de axiomas ou de máximas jurídicas, constituem um pensamento sintetizado em uma única sentença, que expressa uma conclusão reconhecida como verdade consolidada.

Miguel Reale ensina com clareza “que, se nem sempre traduzem princípios gerais ainda subsistentes, atuam como ideias diretoras, que o operador de Direito não pode a priori desprezar”.

E para R. Limongi França “não é forçada e nem constitui novidade, a aproximação entre a noção e brocardo jurídico e a de princípio geral de Direito”

Assim também conclui Orlando Gomes, ao afirmar que os brocardos jurídicos “representam uma condensação tradicional de princípios gerais”.

E o autor cita alguns brocardos que fundamentam as decisões jurídicas.

Bem chega de citações. Aqui me interessa particularmente o brocardo jurídico “Quem pode o mais pode o menos” (ou para os eruditos “im eo quod plus est semper inest et minus”) que conforme cita o autor está na discussão sobre alargamento dos poderes do Ministério Público.

Ora, em princípio, e isto não é por conta do brocardo em questão, é importante afirmar que Constituição Federal é hierarquicamente superior ao Código Penal e todos os demais Códigos e Leis Extravagantes, segundo os ensinamentos de Kelsen.

Bem se diga que este princípio hierárquico está previsto em todos os regimes legitimamente democráticos e, simplesmente, por este motivo o Supremo Tribunal Federal é o Órgão Jurídico máximo do país.

Então, conclui-se que, contrariamente ao que muitos pretendem, inclusive juristas (não é o momento de exemplificar), os Códigos Penal e de Processo Penal não podem ir de encontro ao Texto Constitucional e deverão a Este estarem submetidos. E não se trata de opinião pessoal.

Adentrando um pouco mais sobre no Texto Constitucional, as normais sobre a prisão de parlamentares encontram-se dispostas no artigo 53 e parágrafos:

Art. 53 - Os deputados e Senadores são invioláveis, civil e penalmente por suas opiniões palavras e votos:

§ 2º - Desde a expedição do diploma, os membros do Congresso Nacional ser presos, salvo em flagrante de crime inafiançável. Nesse caso os autos serão remetidos dentro de vinte e quatro horas à casa respectiva, para que, pelo voto da maioria de seus membros, se resolva a prisão.

No parágrafo 3º poderá do mencionado artigo está posto que a casa poderá sustar o andamento da ação, proposta ao Supremo, Órgão Jurisdicional máximo incumbido, constitucionalmente, de julgar os parlamentares, de conformidade com a prerrogativa de “foro privilegiado”.

Os leitores poderão encontrar comentários sobre este artigo e seus §§ em diversos livros de Direito Constitucional. Infelizmente não posso dar mais sugestões porque me desfiz de diversos livros.

E que se diga que estes privilégios são decorrentes do “Princípio da Separação dos Poderes” e da “Indelegabilidade de Atribuições”, ínsitas na Constituição. Que fique claro que não estou discutindo se concordo ou não com esses privilégios, mas somente ressaltando que estes princípios estão “assentes” no Texto Constitucional. Evidente que poderiam tomar outras formas, não tão exageradas.

E quais seriam os fundamentos destes princípios? 

Reproduzo texto do livro “Direito Constitucional esquematizado, de Pedro Lança, 18º Edição:

“Dimitri, com precisão, observa que “seu objetivo fundamental é preservar a liberdade individual, combatendo a concentração de poder, isto é, a tendência “absolutista” de exercício dom poder político pela mesma pessoa ou grupo de pessoas”. A distribuição do poder entre órgãos estatais dotados de independência é tida pelos partidários do liberalismo político como garantia de equilíbrio político que evita ou, pelo menos minimiza os riscos do abuso de poder”.

Tudo isto decorre de uma “evolução” histórica rumo à democracia que começa com a “gloriosa revolução” inglesa, cujos princípios foram posteriormente expostos de modo mais sistematizado por Montesquieu (1689-1755), em “O espírito das leis” (confesso que não li o autor mencionado, mas o livro é muito citado nos cursos de Direito).

Por outro lado a Constituição não trata da questão do “afastamento do parlamentar” para o exercício de suas funções e nem de “medidas cautelares”.

Neste último caso estas medidas redundam em privação de liberdade. Suprir as normas Constitucionais com leis que foram editadas após a sua promulgação me parece uma medida inadequada, porque privação de liberdade, queiramos ou não, está associada à prisão. A Constituição é a Lei Maior e não deve ser interpretada de acordo com uma lei hierarquicamente inferior, inclusive vinda posterior.

Ora, diante deste impasse e levando em consideração o referido brocardo, seria legítimo perguntar se este deveria ser aplicado ao caso em questão, ou seja, afastamento do parlamentar.

Se para prender o parlamentar, mesmo em caso de “flagrante e crime inafiançável”, caso grave, será necessário submeter o caso à casa, porque para afastá-lo não seria? Ou seja, porque razão neste caso a casa estaria afastada da decisão?

A prisão, ou privação de liberdade, no direito penal é o caso extremo, ao que a lei submete o cidadão.

E o mais importante: se for admitido o caso de afastamento, estará aberta a porta para a prisão, como aconteceu anteriormente com outros parlamentares. Isto seria um caso “flagrante” (repito a palavra) de se contornar o Texto Constitucional para impor uma penalidade, que a princípio, estaria fora de cogitação, ou melhor, deverá ser submetida à casa, conforme nos diz a Constituição.

Neste caso, por meios transversos agride-se a Constituição, o que seria impensável, pelo menos enquanto perdurar um regime democrático, que preza pelo estado de direito e garantias constitucionais.  
  
Os mais “afoitos” pretendem rasgar a Constituição, mas caso acontecesse seria necessário uma Nova Constituição. Não se governa sem lei e o “ideal” seria procurar uma alternativa levando a lei em consideração, fazendo os ajustes necessários. Mas até lá prevalece o que está.

Deixo claro que neste artigo não estou preocupado com as vozes de indignação, pois lembro Rui Barbosa: “fora da lei não há salvação”. Para uma lei “revogada” ou rasgada outra posta.

Ou ainda, deveria o Supremo julgar com base nos anseios da população? Neste caso não precisaríamos da justiça, que tanto custa aos cofres públicos. Basta fazer uma enquete popular.

E os ladrões comuns seriam executados de acordo com os anseios dos mais exaltados. Estaríamos, assim, “legitimamente” dentro do Estado de Direito, que muitos querem apenas para si?

Em que pese a indignação com os rumos que a política tomou, temos que julgar de conformidade com a lei, neste caso a Constituição, independentemente se Ela já não se ajusta aos novos valores morais da sociedade.

Então que se mude a Lei Maior. E aí o leitor perguntará como mudar esta Lei se Ela é elaborada pelos próprios parlamentares? Além de ter que obedecer, normas específicas, mais rigorosas, para mudá-la. Pergunta sem resposta visível. Que os agentes sociais criativamente encontrem uma solução.

Da mesma forma, podemos gostar ou não de um Ministro ou Juiz, não gostar de suas decisões e até fazer críticas sobre a sua vida particular, se para isto tivermos acesso às informações sobre os conchavos e outras coisas mais. Mas seria no mínimo insensato reprová-lo apenas pelo fato de que as suas decisões não atenderam às nossas expectativas. Teríamos de verificar se os seus argumentos estão enquadrados dentro da legislação. 
  
Verdade seja dita que existem muitas lacunas e uma névoa cinza permite navegar e interpretar as leis de acordo com interesses escusos, a favor das facilidades e do jogo do poder.

Muito mal faz a imprensa em eleger um Magistrado ou Ministro Superior para contrapô-lo sempre aos anseios da população. Que critiquem suas decisões com base em argumentos jurídicos e não simplesmente morais, pois que vota-se de acordo também com a moralidade quando ela se enquadra no texto legal. E não poderia ser diferente.  

Acredito que se existe alguma reparação a ser feita sobre a decisão dos Ministros do Supremo e de outros Magistrados diz respeito à questão da “segurança jurídica”, que nada mais é que a sinalização da lei para a sociedade, a sua referência para os agentes sociais, muito bem explorada em matéria da revista Veja em sua edição de 18 de outubro, no artigo “Teatro Jurídico”.

Segundo o professor Rubens Glezer, da Fundação Getúlio Vargas:

“Acredito que a autoridade do Supremo está em cheque, mas não necessariamente pelo conteúdo da decisão. [...] Esse é um resultado da percepção da inconsistência das decisões que mudam ao sabor da ocasião e do voluntarismo dos ministros que agem como bem querem”.

E a revista vai além: “Para piorar, o Supremo não é a única instituição a agir segundo os ventos da hora”. Sinal de que a sociedade está em crise, moral, política, jurisdicional.

Pelo que expus neste artigo não precisa dizer que concordo com o resultado, com o devido respeito à indignação das pessoas, principalmente os desafortunados.

Mas é a Lei Maior que está em jogo.

E para finalizar, me choca mais ver Magistrados e Ministros fugirem ao Texto da Constituição, para abraçar ideias que vão de encontro às suas normas e princípios.  

Por isso concluo que "A indignação não substitui a lei".




quinta-feira, 19 de outubro de 2017

NOVO PRÊMIO NOBEL PARA A ECONOMIA COMPORTAMENTAL

NOVO NOBEL PARA A ECONOMIA COMPORTAMENTAL

Confesso que não me causou qualquer surpresa a indicação de um economista da Escola Comportamental novamente para o Prêmio Nobel de economia.

A economia comportamental é um ramo da economia que não trata da economia propriamente dita, mas sim do comportamento dos agentes econômicos, “procurando dar destaque e primazia aos fatores psicológicos dos agentes econômicos, como determinantes das diversas variáveis e aspectos da atividade econômica, notadamente a importância para os aspectos conjunturais da economia e seus ciclos” (Um Raio X sobre “O espírito animal”, neste site). 

Outrossim, procuram enfatizar que os agentes econômicos não se comportam tão racionalmente quanto se supunha em relação ao “homo economicus”, fundamento de toda a economia clássica.

Ora, há muito, todos sabemos que o “homo economicus” foi uma construção ideológica (no sentido marxista) que serviu para vestir a também ideológica economia clássica.

No meu primeiro artigo sobre economia, “Direito, economia e mercados racionais – uma crítica aos economistas racionais”, abordei este assunto da irracionalidade sob um ponto de vista histórico, freudiano (psicanalítico) e, de uma forma bastante superficial, da neurociência.

Também comentei sobre “O paradoxo da mão invisível e dos mercados racionais”, com uma crítica sobre “A racionalidade dos economistas racionais” e como esta teoria caminhava em contramão com a “realidade” e o Direito, “indo de encontro aos princípios jurídicos mais elementares que estão em consonância com as vicissitudes e as necessidades das sociedades atuais”.  

Posteriormente, postei um outro artigo intitulado “Um raio X sobre o “Espírito animal””, em referência ao livro de George A. Akderlof e de Robert J. Shiller, agraciados com o Prêmio Nobel de economia em 2001, que por sinal, distorceram Keynes ao plagiarem a sua expressão. 

Ora, que o comportamento humano não é racional, no sentido em que estes economistas queriam dar, já bem sabiam os escritores, mormente os romancistas. 

Pode parecer estranho, mas poderíamos até dizer que Freud não descobriu o inconsciente, e sim procurou aflorar o inconsciente, trazê-lo à “razão”, através do método " livre associação", que pode e foi questionado.

Também bem o demonstrou o behaviorismo, com Pavlov e as suas experiências em cães sobre reflexo condicionado, com fundamento na mecânica clássica, estímulo - resposta.   

E não podemos esquecer a importância que a propagada assumiu nas opções e decisões dos agentes econômicos, há décadas, evoluindo para a propaganda subliminar. Deixar de levá-la em consideração seria admitir que os empresários são idiotas e gostam de gastar milhões sem que tenham quaisquer retornos e proveitos econômicos e financeiros. 

Pascal (1623-1662) matemático, físico e filósofo francês já afirmara que “O coração tem razões que a própria razão desconhece”, frase que a criatividade musical dos brasileiros levou-o para a música popular: “Aos pés da Santa Cruz/ você se ajoelhou/ e em nome de Jesus/ um grande amor você jurou/jurou, mas não cumpriu/ fingiu e me enganou/pra mi você mentiu/pra Deus você pecou/ o coração tem razões que a própria razão desconhece/ faz promessas e juras/ depois esquece ...”.

De Pascal também encontramos: “O último esforço da razão é reconhecer que existe uma infinidade de coisas que a ultrapassam”.

E Marx dizia que não podemos acreditar no que um homem diz de si.

Em 2006, Japiassú de forma bastante elegante afirmava que "O desafio da razão é o de tentar explicar tão racionalmente quanto possível a desrazão e o irracional, inseparáveis dos comportamentos humanos" (em "Como nasceu a ciência moderna)

O que estes economistas comportamentais ainda não entenderam, ou não querem, é que a comprovação do comportamento “não racional” do ser humano serviu apenas para jogar por terra a teoria “dos mercados racionais e perfeitos”, fundamentada no pressuposto ideológico do “homo economicus”. 

Este reconhecimento não passa disto e não serve para explicar as leis que regem a economia capitalista. Tratam-se apenas de escolhas individuais racionais que no conjunto tornam-se irracionais. É isto que nos ensina a dialética: "o todo não é a soma das partes".  

Até ajudam a esclarecer certos pontos sobre o comportamento em manada e outros, que aceleram e aprofundam as crises, mas não servem para explicar as crises. É comum os dirigentes governamentais dizerem que a crise é “de confiança”. Ver comentários no artigo "Um Raio X sobre o "Espírito animal"", neste blog. 

Mas, estes comportamentos irracionais ou racionais, não conseguem explicar a crise de demanda efetiva, elaborada por Keynes e Kalecki, nem as crises financeiras de Minsky. Não conseguem explicar porque o mercado financeiro se descola do mercado “real”, de bens, etc. E isto independe dos comportamentos racionais, irracionais, neurais, genéticos do ser humano.

Com estas teorias pretendem substituir as leis intrínsecas e instáveis da economia capitalista, que cominam em crises econômicas, pelo comportamento irracional dos agentes socioeconômicos. Agora, as crises da economia têm fundamentos nos comportamentais irracionais do ser humano. 

Não dão importância a “financeirização” da economia, as suas razões políticas, sociais e econômicas, a “concentração e centralização” do capital, analisadas por Marx, a “internacionalização das etapas dos processos produtivos”, o "poder econômico, político e financeiro das empresas multinacionais" e as "relações de poder" (que permeiam as relações socioeconômicas), que tanto distorcem, modificam e dificultam a regulação das economias.

Tampouco se importam como estas relações repercutem nas nações subdesenvolvidas, agravando os seus problemas sociais,  mormente a fome. 

Os economistas, mais precisamente por uma questão da relação poder-saber, ou quem sabe até por uma "razão que a própria razão desconhece", sempre pretenderam fazer da economia o pilar da sociedade, relegando a política para um segundo plano. De um modo geral os engenheiros e cientistas não têm tanta atração pela mídia e não dão IBOP.  E eis o paradoxo: quanto mais discordam mais interessantes se tornam. Lembrem-se de Irving Fisher e os seus conselhos que o levaram à falência nos idos de 1929 (Consultar "1929" de Ivan Santana). 

Para a felicidade da grande maioria dos economistas, o regozijo veio quando nas eleições de 1992 o candidato Bill Clinton usou a expressão "It's the economy, stupid", para vencer o seu oposicionista.

Em recente artigo postado neste blog, "Obstáculos socioculturais ao desenvolvimento econômico", comentários sobre Ha-Joon Chang, afirmei:

"A ideia de que a economia é o alicerce ou a infraestrutura da sociedade não ajuda a clarear a situação. Isto porque nos traz a conotação de que primeiro seria necessário implementar as medidas econômicas para posteriormente construirmos o arcabouço institucional, legal, político, ideológico, educacional (científico e tecnológico). Não estamos a falar de engenharia e construção de prédios".

Por trás disso tudo existe sempre uma questão política e ideológica, que seria desfocar e despolitizar. Quem sabe a sociedade capitalista "precisa" sobreviver e todas sociedades trazem suas próprias ideologias. Mas, não precisavam exagerar. Não precisam divulgar falsamente e de forma tão acintosa o que elas não podem fazer.  

Ficam neste joguinho de pingue-pongue, bolinha para lá, bolinha para cá, sem qualquer contribuição digna de um Prêmio Nobel.

Quando olho para estes Prêmios Nobel de Economia não consigo deixar de lembrar e pensar nos economistas que advogavam a “teoria dos mercados perfeitos e racionais”, já de muito descreditadas, que foram agraciados com o Prêmio Nobel, sob o lobby da Universidade de Chicago. E pelo visto ela continua ativa. E com esta grande teoria contribuíram para a crise de 2007. E quanto as responsabilidades? Nada. 

Ora, isto nos leva a questão do saber-poder em nossa sociedade, tão bem analisada por Japiassú em “O nascimento da ciência moderna” e “O mito da neutralidade científica”, e explorada por mim no artigo “Modelos matemáticos – porque eles falham”, postado neste blog.

Meu Deus! Quanta inutilidade sobre um assunto comportamental que já não tem tanta importância sobre a sua repercussão na economia e que são melhores explorados pela neurociência, a genética e a psicanálise. Foi-se. 

E me vem sempre o pergunta: porque o berço dessas "anomalias teóricas" são sempre os Estados Unidos?

Há muito que os economistas não contribuem com algo importante. estão alheios aos acontecimentos e contribuições mais avançadas das outras ciências. Vivem da vaidade, formulando modelos matemáticos sofisticados sem qualquer vínculo com a realidade e dando opiniões na mídia sobre os mercados financeiros. Agora, surge um novo ramo da economia que é totalmente improdutivo se comparado às contribuições de outros ramos científicos.

No artigo "A crise de 2008 e as informações assimétricas", mais especificamente no tópico "A ideologia e seus efeitos funestos" assim me expressei:

"Causa espanto como pessoas tão inteligentes, capazes de elaborar modelos econométricos sofisticadíssimos, se ocupam de coisas tão infrutíferas e irreais". E se rendem aos argumentos mais simplórios, que o ser humano mais humilde ignora. 

Fico imaginando o custo social de tudo isto. Afinal, onde encontramos a eficácia da alocação dos recursos na economia capitalista, que tanto, "repetidamente", nos ensinaram? Ao que tudo indica trata-se de mais uma ideologia.

Conforme afirmei no início deste artigo, não me causou surpresa a indicação de um Nobel para um economista comportamental. Mas, sim, ainda me causa espanto, tanto irracionalidade dos economistas e de seus fieis seguidores. Infelizmente, a economia já vive há algum tempo de modismos e este é mais um.

Entretanto, acredito ser dever de qualquer um procurar as raízes de tantas irracionalidades, principalmente num momento de crise em que os recursos se tornaram mais escassos e os governos não se cansam de anunciar e propagar cortes em programas sociais, em nome de uma melhor alocação de recursos, enfim, da eficiência.Tudo um farsa. 

Sobre o comportamento humano e sua "irracionalidade" e a importância da neurociência sugiro aos leitores interessados três livros bastante interessantes, os dois primeiros bem accessíveis: 

- "Subliminar - como o inconsciente influencia nossas vidas",  de Leonard Mlodinov, Zahar;

- " O Cérebro - a descoberta de quem somos", de David Eagleman, Ed. Lua de Mel;

- Neuro economia - ensaio sobre a sociobiologia do comportamento", de José Eduardo Carvalho, Edições Sílabo. 

E para os estudantes de economia sugiro que parem de ler estes economistas comportamentais. Com certeza darão um grande passo e sobrará mais tempo para se dedicarem ao que interessa. 

Obs: em breve pretendo acrescentar num Apêndice algumas frases do livro "O cérebro", que acredito serão muito úteis aos leitores.  

sábado, 14 de outubro de 2017

A ARTE SEM CRIATIVIDADE, TALENTO E TRABALHO

 A “arte” sem criatividade, talento e trabalho.                       
      (uma pequena contribuição de um leigo sobre a arte atual)

A polêmica sobre as exposições recentes em Porto Alegre e São Paulo, ativaram as mentes da sociedade, com pronunciamentos de diversas pessoas, inclusive aquelas não tão interessadas, em nome da moralidade, dos bons costumes, da lei, do respeito ao menor, considerado ainda não psicologicamente maduro e também da estética artística.

Não seria preciso frisar que os comentários aqui esboçados são individuais, por parte de quem não é um especialista em arte, mas teve a oportunidade de visitar ao longo de sua vida, diversos museus e Igrejas da Europa, Estados Unidos e Brasil, sempre com um pouco de curiosidade sobre as artes pictóricas, as esculturas e até um pouco da arquitetura e os comentários a respeito daquelas que mais lhe interessaram. Digo isto apenas para realçar que minhas opiniões possuem um viés e como disse não sou especialista.

Confesso a minha preferência pelo classicismo da Renascença,  barroco, impressionismo, expressionismo, em determinado momento o cubismo e alguma coisa da arte abstrata (Kandinsky por exemplo). Sem querer ser desrespeitoso com os demais: Botticelli, Da Vinci, Michelangelo, Caravaggio, Velázquez, os impressionistas de um modo geral (Monet, Renoir, Degas), Cezanne, Munch (O grito), Matisse, Picasso, Miró, Kandinsky (pai do abstracionismo) e até gosto um pouco de Pallock. Talvez seja um saudosista e por isso não tenho grande interesse pela arte atual.

Importante que esclareça que o artigo não pretende ser um estudo sobre a arte, a sua história e evolução, muito menos uma referência sobre o assunto. Tudo, ou quase tudo, do que é dito aqui sobre alguns estilos artísticos anteriores e seus renomados artistas pode ser encontrado em alguns livros, óbvio. Não tenho bagagem para ser expoente no assunto, não sou um estudioso da arte, apenas um curioso esporádico. E, em muitos casos, tenho até dificuldades para digerir o que os estudiosos dizem. 

Entretanto, não poderia deixar de expressar o meu descontentamento com os rumo da arte moderna e para isto tive que recorrer, em meu auxílio, de forma bastante sucinta, o que foi e continua sendo dito sobre os diversos estilos artísticos. 

E só poderia dar a minha opinião sobre a arte "interativa" atual fazendo uma referência e um breve comparativo com outros estilos artísticos, o que eles têm em comum e que os distingue da arte atual.  

Por estes motivos o problema passou a ser a dificuldade em conciliar o muito que poderá ser dito sobre arte, com o necessário e a extensão do artigo, sem que isto traga um desinteresse pelo leitor. Caso isto ocorra poderá ele se concentrar nos tópicos "Elementos necessários a uma boa obra de arte", "Conclusão" e, logicamente, na minha "Proposta", sobre como ganhar um trocado com esta arte. Quem sabe possam se interessar e considerar uma ideia "genial". 

Relendo, percebi que muitas assuntos poderiam ser melhor retratados com exemplos e enriquecidos, sem comprometer a sua característica de artigo. É o que pretendo fazer em breve, citando a pintura "O grito" do artista norueguês Edward Munch.

Conhecer arte

Admirar e entender de arte não parece uma tarefa tão simples quanto vulgarmente se imagina. Não é apenas dizer gostei ou não gostei. Além da sensibilidade, em captar o impacto e a expressão da obra, deve-se estar atento para o ambiente social e cultural à época, à evolução e a qualidade dos materiais, a vida do artista, suas correspondências e opiniões. Comparar suas obras com outras de artistas contemporâneos. Nas artes sacras, ou temas religiosos, conhecer as passagens e os seus significados, conhecer os mitos quando se tratam de obras carregadas de representações mitológicas.

Além disto, é necessário se descondicionar e desnudar das convenções, quando se trata de uma obra criativa, inédita, revolucionária, em termos artísticos e não socialmente. Voltarei a este assunto oportunamente.  Por isso, verdadeiros artistas criativos só foram posteriormente reconhecidos. Estavam além de seu tempo.

Dou-lhes um exemplo: embora fosse aficionado pela musica clássica de Mozart e Vivaldi, com toda aquela harmonia, só consegui realmente admirar Beethoven quando um profundo conhecer me explicou o significado de sua música e o momento em que ele rompeu com o classicismo.

Da mesma forma, não se pode admirar toda a beleza de “ A volta do filho pródigo”, de Rembrant, sem saber o seu significado bíblico, que inclusive pode ter duas interpretações. Muitos dos artistas de hoje não têm cultura artista, não experimentam, não trabalham “verdadeiramente”. O mesmo se diga da obra "A incredulidade de São Tomé", de Caravaggio, com comentários no tópico sobre o Barroco. 

Entendo a arte pictórica e escultura como a combinação de três elementos ou fatores: criatividade, talento (habilidade no trato do objeto da arte) e trabalho.

Os elementos necessários a uma boa obra de arte

Acho muito difícil conceituar com limites definidos e fixos estes elementos porque de uma certa forma eles interagem entre si e contribuem para com o outro.

Criatividade: “inventividade, inteligência e talento, natos ou adquiridos, para criar (nada disse), inventar, inovar quer no campo estético ....” (Google).

Acredito que na arte seria o novo, a originalidade, que não deixa de ser uma forma de talento, a maneira individual que o artista aborda o tema da obra, incluindo nela o uso dos materiais utilizados na sua elaboração, para ajuda-lo na sua forma de expressão.

Talento: seria o dom, a habilidade em tratar com o objeto, de transmitir expressividade, uma mensagem própria, através do cromatismo, da plasticidade, da disposição dos elementos que compões o quadro, da luminosidade, da habilidade no desenho, para as artes que estavam mais associadas a uma reprodução dos elementos naturais e humanos. 

Podemos observar que também estes atributos fazem parte da criatividade. Mas, tanto a criatividade quanto o talento podem ser aprimorados através da aprendizagem, da experimentação, do contato com outras obras diversas, como Picasso com a arte africana e asiática.

Por exemplo, com o seu “sfumato” Da Vinci demonstrou tanto criatividade quanto talento. Como distinguir? E existem obras em que se percebe mais o talento, mas nem por isso deixa de haver criatividade.

Da combinação destes dois elementos e da disposição dos demais elementos em torno do elemento central o artista dá expressividade à sua obra (pictórica).

Trabalho: o esforço físico e mental que o artista dispende durante a execução da sua obra, bem como os projetos, ou a pré-elaboração.

Se visitarmos a obra “Guernica”, do pintor Picasso, podemos observar os seus preparativos, que deveras consumiram mais trabalho do que a elaboração da própria obra. O esforço do antes e do durante encontra-se materializado na obra do artista, muito embora não possamos distinguir. Também é este o momento da experimentação, das tentativas.

Ora, se é através do trabalho que o artista alarga a sua criatividade, e através da experimentação que aprimora o seu talento. Nesse sentido, o trabalho não deixa de ser a materialização da criatividade e do talento.

Portanto, o que quero esclarecer é que para mim estes três elementos não se destacam de forma tão individual, embora possamos ter uma ligeira impressão ou ideia de cada um deles. Mas eles formam um todo que dão expressividade a obra de arte.

Mesmo estando mais focado na arte pictórica, acredito que não existe uma obra dita de arte em que não esteja presente estes elementos, logicamente de forma diferenciada.

Por exemplo, na arquitetura o artista (arquiteto) planeja a obra, que é o seu trabalho e onde estão a sua criatividade e talento, mas não a executa e nem mesmo controla.

Na ópera considerada por muitos a mais perfeita obra de arte, onde estão em presentes e em conjunção diversas artes, canto, interpretação, enredo, música, cenário, o artista dono do show, interpreta e embora tenha o dom da voz, dispende esforço físico e mental, além de se envolver nos ensaios (experimentação).

No teatro o artista (a) interpreta (talento), cria na sua interpretação, dá o seu toque, faz o seu trabalho durante o espetáculo e participa dos ensaios. O mesmo se pode dizer da dança.

Exemplos e comentários sobre algumas obras de arte e artistas

Para uma melhor facilidade de expor o que desejo transmitir passo a comentar algumas obras de arte juntamente com os seus protagonistas (artistas), sem obedecer uma ordem cronológica.

Capela Sistina (Vaticano): quando se adentra na Capela Sistina somos absorvidos por uma das obras mais impressionantes de que se tem história. Ficamos imaginando o trabalho do artista, seu esforço físico e mental para concluí-la.

Se for religioso e cristão será tomado por uma espiritualidade invulgar. Somente a esquemática da obra demorou quatro anos. Sabe-se que o artista realizou o seu trabalho de forma bastante desconfortável, havendo até uma hipótese de tê-lo feito deitado, posteriormente negada por Vasari. 

Compõem a obra diversos temas com cenas do Gênesis, desde a Criação, o Pecado Original e ao Juízo final. Seu símbolo mais divulgado, com milhões de reproduções fotográficas, é o detalhe do toque entre os dedos de Deus e Adão.

Para entendê-la precisaríamos de um longo esclarecimento sobre o esboço da obra, os significados bíblicos. Mas, não se espantem, porque é possível admirá-la sem que seja um profundo estudioso. Este é o milagre.

Não conseguimos distinguir a criatividade, o talento e o trabalho do artista, todos convergindo para uma expressividade da obra, como um todo, sendo impossível separar os 3 elementos, muito embora possamos tentar ter uma superficial e imperfeita ideia de cada um deles no contexto.

Mona Lisa: possivelmente a obra mais famosa do mundo, do pintor e “cientista” Da Vinci. Através do “sfumato” podemos ter noção de toda a criatividade e talento do artista, com o jogo de cores, com as imagens se dispersando como que cobertas por uma névoa. O seu trabalho incluía diversos estudos sobre a técnica da perspectiva, da qual foi um expoente.

E no final a pergunta: Está Mona Lisa sorrindo? A resposta fica por conta do observador. Há interação entre a obra e o observador?

Picasso: considerado um dos artistas mais talentosos e produtivos, passeou ao longo da vida por diversos estilos, sendo precursor, juntamente com Braque, do “cubismo”. Com “Les Demoiselles d’Avigonon” inicia um novo estilo artístico, com repercussões durante todo o século XX.

Considerado um exímio desenhista optou por uma arte que quebrou com os padrões do classicismo, inaugurando a arte moderna. Foi um trabalhador incansável até o final de seus 92 anos, realizando diversos experimentos com cores, composições  e materiais trabalho. Foi também brilhante escultor.

Quer gostemos ou não da sua arte “modernista” não podemos pensar os rumos da arte do século XX sem Picasso.

Matisse: quase o mesmo se diga deste artista que no final da vida, com problemas de saúde não podia trabalhar em pé, mas isto não o impediu de tentar novos experimentos e novas formas de composição.

Na sua obra mais famosa “A dança” empregou toda a sua criatividade e talento para exprimir a sutileza e leveza dessa arte, com apenas quatro cores, sem preocupações dos mínimos detalhes físicos.

E aqui é onde mora a sua genialidade: parece pintura de criança (como muitos pensam), mas não conseguem fazer nem de longe algo parecido, com tanta expressividade e simplicidade.

Van Gogh: que não liberto de sua doença mental crônica libertou as cores, num ato de extrema ousadia e, infelizmente, não foi reconhecido durante a sua existência.

Trabalhador compulsivo despejou o seu talento e criatividade em torno de 900 obras de arte, entre elas “Noite estrelada” de extrema originalidade e beleza, quando somos tomados por um turbilhão de sensações, que não sabemos explicar e discernir.  Também “Ciprestes”, “Girassóis” e diversos autos retratos.

Introduziu de forma forte o amarelo em suas composições talvez por problemas de alimentação e extravagâncias no manuseio das cores. Identificava o amarelo na cabeça das figuras como uma “aura” dos santos.

Se quisermos ter uma ideia de sua criatividade e talento basta ir ao Museu do mesmo nome do artista, em Amsterdã, e presenciar e comparar as suas obras com as de outros artistas “clássicos”, sobre os mesmos temas e figuras.

Rodin (impressionista) e Vigeland: mudando um pouco para a escultura, quem vai a Paris não pode deixar de passear pelos jardins do Museu Rodin e apreciar a beleza, criatividade, talento e trabalho, da “Porta do Inferno”, “Le penser”, “Les bourgeois de Calais”, “O beijo” (de extrema sensualidade).

A “Porta do Inferno” esculpida em bronze e reboco, foi iniciada em 1880 e finda em 1917. Com figuras as mais expressivas, algumas se sobrepondo nuas umas sobre as outras, outras se contorcendo como que num “transe” as vezes diabólico, numa dança de frenética horrores (minha interpretação), com expressões de sofrimento, com a nuance do pensador encima, mão sob o queixo, como que pensando, pensando (afinal trata-se do “Le penser”), imaginando, questionando. Somos tomados por um misto de espanto e admiração. E quem é religioso? Nem sei.

Quem estiver interessado em compartilhar e desfrutar gratuitamente de uma "grandiosa" e verdadeira obra de arte vá ao Parque de Escultura de Guatav Vigeland (1869-1943), em Oslo. 

São 212 esculturas de granito e bronze, diversas em tamanho natural, além do próprio Parque, desenhado pelo artista, com um obelisco central, onde o artista retrata passagens de sua vida. Não esculpiu todas as obras e teve a colaboração de outros artesãos, sob sua orientação. Vigeland trabalhou com Rodin (não sabia) e doou as suas obras ao governo. .

Na ponte estão distribuídas diversas esculturas, que realçam, entre outras coisas, as relações entre pais e filhos, no cotidiano da vida. Quem é pai ou mãe pode relembrar, com a singeleza e sutlileza das obras, os momentos de suas relações afetivas com os filhos, as suas brincadeiras (pai jogando o filho para o alto, como fazíamos) e os de tensão e educação (pai repreendendo filho). Recomendado também para os (as) saudosistas que gostem de relembrar os grandes amores. 

Rembrant: na obra “A volta do filho pródigo”, texto bíblico, Museu Hermitage, São Petersburgo, Rembrant mostra toda a sua genialidade, criatividade e talento, com o cromatismo, a composição integrada às figuras principais, a imagem perceptível do filho injuriado e enciumado, com a luminosidade focada para o pai abraçando e perdoando o filho envergonhado e ajoelhado, como que pedindo perdão, pelas suas aventuras e desperdício.


A arte, a cultura e a lei

Anteriormente, havia comentado que o contexto cultural tem uma grande importância sobre a criação de uma obra de arte, visão esta que vai de confronto com a ideia de que a arte é sempre revolucionária, de contestação dos padrões culturais. A história não confirma isto. Vejamos.

Arte rupestre: de extremo simbolismo sobre a atividade do ser humano sobre o seu meio ambiente, esta arte espera que o que foi pintado se realizará no mundo real (me parece ser a opinião de Hauser, já não possuo o seu livro).

Arte tribal (algumas): comunitária e socializante, invoca-se através de máscaras e ritos de dança a presença dos bons espíritos, para que contribuam nas boas colheitas. Por outro lado, através de máscaras horrendas pretende-se espantar e afastar os maus espíritos que poderão interferir de forma perniciosa na vida da tribo e na natureza, com prejuízos para a comunidade. Isso comprova que a arte não tem que ser necessariamente bela. Torna-se bela com os valores burgueses. E agora, mesmo com a alta burguesia tornou-se extravagante e horrível, em todos os aspectos.

Arte clássica: arte do Renascimento, que para o leitor um pouco familiarizado não precisa de comentários extensivos, sendo importante lembrar que ocorreu num momento de grandes transformações e que os artistas deram grandes contribuições nesse desenrolar, com o apoio dos grandes “mecenas”, sendo um deles e o mais lembrado a família Médici, de Florença e pela Igreja Católica. Afinal quem não conhece as contribuições de Da Vinci também para a ciência? 

O Renascimento é antes de tudo um movimento cultural, do final da idade média, que busca um resgate dos valores e referências culturais (também estéticas) da antiguidade, mormente da Grécia, muito embora apresente suas peculiaridades, com Sandro Botticelli, Da Vinci, Donatello (escultura) e outros. 

Também  pode-se dizer, que após Nicolau Copérnico, com a teoria do Heliocentrismo, abrem-se as portas para o desabrochar da ciência moderna no século seguinte a sua morte. E os artistas desempenharam importante papel nessas transformações.

Na pintura nasce a perspectiva, cujo expoente máximo é Da Vinci, dentro de um equilíbrio pictórico, com uma figura central em realce, concentrando as atenções. Também Da Vinci e Botticelli dão expressão às individualidades dos personagens representados, o que não ocorria na Alta Idade Média. Muito das suas obras encontram -se  no Museu Uffizi, em Florença.  

Antes do passo seguinte, cabe uma pergunta. Porque será que Florença é tomada por pessoas de todos os cantos do mundo (inclusive uma multidão de asiáticos) que vão para apreciar estas obras clássicas? Será por ignorância em distinguir e dar o devido valor a uma obra de arte?

Barroco na pintura: uma arte que segundo Hauser nasce dos conflitos religiosos entre católicos e protestantes. Ainda de acordo com o autor, de grande importância seria “O Concílio de Trento”, uma reação da Igreja Católica contra a Reforma Protestante, aproximando-se dos cidadãos comuns, dos humanos.  

Nesta arte os santos já não são diferentes dos seres humanos comuns, são de carne e osso, até mesmo Cristo, aparecem velhos, com cicatrizes e com feridas. 

Um exemplo é a obra “Incredulidade de São Tomé”, de Caravaggio (uma das minhas prediletas) baseada na passagem bíblica em que São Tomé descrente da Ressurreição de Cristo afirma que precisa "ver", tocá-lo em Suas chagas, "para crer". A quem Cristo se dirige e afirma: "Tomé, porque me viste, acreditaste? Bem-aventurados os que não viram e creem". Daí a expressão tão comum: igual a São Tomé, precisa ver para acreditar. 

O impressionismo: muito influenciado pelo maquinismo (movimento), pela luminosidade e pelas revelações da fotografia. Rompe com os temas mitológicos, bíblicos e procura captar momentos da vida cotidiana. 

Muda-se a arte, procura-se captar o instante, o momento, porque o objeto não nos parece o mesmo nos momentos diferentes. O que se pensava sobre a retratação a fotografia revela uma realidade diferente. Arte do cavalete vai para as ruas e locais descampados para captar o momento específico do objeto a ser retratado, com  luminosidade.

Mudam-se as pinceladas, já não há tempo para uma demorada elaboração. Abandona-se definitivamente a perspectiva nos moldes do desenhado clássico, sendo ela retratada pelo jogo de cores. 

Há impressão sobre a obra de arte quando a observamos de longe, parecendo haver detalhes na composição, mas quando nos aproximamos a obra se reduz a pinceladas rápidas, muitas vezes espaçadas e livres (soltas).

Segundo Ferreira Gular é o início da abstração, com ele começa a morrer a pintura figurativa, já não se retrata o objeto em si, mas apenas impressões sobre ele. "A fidelidade do mundo natural transferira-se da objetivação para a impressão" (Etapas da arte contemporânea, Ed. Revan, 1998, p.289/290).

Para mim, encontramos um bom exemplo destas características nas obras de Claude Monet, "Ponte da Europa" e em "Gare Saint-Lazare". Maquinismo, movimento, luminosidade, fumaça que se dispersa instantaneamente. 

Dadá: arte que reflete a descrença na humanidade (niilismo), no futuro e na ciência, aplicada para fabricação de artefatos destrutivos, vivenciado na primeira grande guerra.

Para mim foi difícil percebê-la na pintura, mas com um exemplo podemos melhor entende-la.

Numa representação artística aparece uma moça nova, com cara de ingênua, vestida de colegial e talvez religiosa. Entra no palco e começa a gritar uma porção de palavrões, com cenas também ofensivas e  pornográficas.

A ingenuidade era uma farsa, assim como foi a credibilidade na ciência a serviço do homem. Caiu em desuso, mas as sua ideologia ainda está na base de toda arte que queira chocar e agredir. Um de seus expoentes foi Marcel Duchamp, aquele do mictório, da roda de bicicleta sobre um cavalete e da Mona Lisa com bigode.

"O Dadaismo era, acima de tudo, a expressão de uma atitude mental através da qual a juventude internacional chegava às convulsões sociais e políticas da época. Eles formulavam a sua oposição através de ações, reações e trabalhos artísticos visuais anárquicos, irracionais, contraditórios e literalmente sem sentido" (Arte Moderna - do impressionismo à atualidade, Ed. Taschen, 2016, p. 266). Os negritos são meus. 

Considerado um dos precursores da arte “Conceitual”, cerebral,  e do “ready made”. Na minha concepção não foi um grande artista, nem produziu uma arte digna desse nome.

Muito inteligente era um espirituoso e muito bem articulado, circulando nos principais meios artísticos da época.

Surrealismo: arte influenciada pelo “inconsciente” freudiano e pelos sonhos. Não procura fazer da arte uma atividade racional, se expressando de modo compulsivo, realçando o inconsciente.

Pop: ou "pop art", acho que o nome já é bastante significativo. Seu berço é a Inglaterra mas, logicamente, encontra o ambiente ideal para a sua propagação nos EUA, do pós-guerra, com o crescimento contínuo de sua economia, em virtude do consumo reprimido, no período de guerra, com a divulgação do "american way of life". 

É uma arte que anda de braços dados com a publicidade. Se desejam se aprofundar basta consultarem a vida do artista pop Andy Wahrol. Evidentemente, sem críticas ao seu estilo todo pessoal de levar a vida. Entretanto, na minha opinião, não podemos deixar de reconhecer o elo entre o seu modo extravagante e a projeção midiática de sua arte. Um assunto para uma outra oportunidade. 

Quanto ao seu expoente máximo, idolatrado, verdadeiro artista "pop", competindo em popularidade com as estrelas de Hollywood, Andy Warhol, por hora gostaria de dizer apenas, em poucas palavras, o que já disse em outro artigo neste blog. 

Talvez o artista mais “midiático” de todos os tempos, seguindo os passos iniciados de Duchamp. De tanto repetir figuras em uma "suposta" crítica à sociedade de consumo (para alguns), ou mesmo realçar a uniformidade consumista, tornou-se “repetitivo”. 

Segundo comentários nesse outro artigo, a ideia original de repetição das figuras não foi sua, embora a abraçasse melhor que ninguém e fizesse bem uso, com o seu poder “midiático”.

A Arte interativa é arte?
 
Quando me refiro a arte interativa estou interessado nas questões levantadas em geral pelo público brasileiro em reação as exposições em Porto Alegre e São Paulo.

A indignação tomou conta contra as exposições com cenas que para alguns seria contra a moralidade e aos bons costumes.

Inicialmente, tirando estes aspectos morais, procuro analisar a presença de um “artista” nu que interage com uma criança sob os incentivos da mãe de tocá-lo.

Sinceramente, não vejo nesta “arte” quaisquer traços de  originalidade, talento artístico e muito menos trabalho.  O “nu” é um estado do ser humano e para expô-lo não precisa-se de qualquer um desses elementos, que para mim, são indispensáveis para classificar uma boa ou grande obra de arte, digna de ser apreciada.

Ficamos neste estado quase todos os dias, quando vamos tomar banho, fazer as necessidades fisiológicas ou fazer sexo. Nada há de extraordinário neste ato, que possa ter a qualificação de uma obra de arte. A única coisa a fazer é ficar nu e se expor ao público que visita o museu. Também não precisa de inteligência, podendo ser qualquer um, inclusive uma pessoa desprovida de inteligência, nem culta. Existem muitas pessoas talentosas que não tiveram oportunidade de ter uma educação mais aprimorada e que poderiam até alcançar o estrelato se pudessem usufruir desses meios e ter boas relações no meio artístico.  

Me parece que o mesmo, em certo sentido pode se dizer as figuras sexuais expostas no museu de Porto Alegre, sob o patrocínio do Banco Santander.

Cenas de sexo sempre existiram na Roma antiga, nas paredes das casas dos comerciantes ricos de Pompeia, mas com uma conotação e dentro de uma cultura totalmente diversa. 

E este "simples" fato não significa que obrigatoriamente tenhamos que copiar e participar daqueles valores. Afinal de contas existiu e talvez ainda o "canibalismo" e nem por isso admitimos em nossa sociedade. Como também existiram e talvez existam sociedades em que o estupro e a relação sexual com "adolescentes" eram normais e faziam parte do debate sobre os calores éticos - Grécia (não quero emitir julgamento sobre vídeos atuais atuais vídeos publicados no Face ou Internet). Fiquemos por aqui, pois o assunto me parece óbvio demais para ficar discutindo sobre isto.

Não faz muito tempo que no Brasil e em outros diversos países existia a escravidão. Por acaso, alguém concorda em reimplantá-la? E este novo sentimento é um valor ético ou apenas uma questão de força? Se a escravidão acabou-se por uma imposição moral burguesa, com suporte em questões econômicas e mercadológicas, pouco interessa nesse momento, ou melhor, interessa aos historiadores e demais pessoas que querem pautar o seu comportamento levando em consideração novos valores morais, mesmo porque não participaram dos anteriores e não possuem os vícios e condicionamentos que marcaram aquela época.  Então aplaudamos o fim da escravatura, criando barreiras para que situações semelhantes não voltem a acontecer com povos mais humildes e economicamente vulneráveis.

Também na Índia o Kama Sutra, com diversas posições de sexo. Mas lá, estas fotos e desenhos não são considerados arte, pois não existe originalidade e o talento se reduz a um belo ou não belo desenho de sexo. 

Ou seja, também neste caso não precisamos de criatividade nem de talento. Qualquer um de nós com um pouco de aprendizado pode fazer um desenho sobre sexo a dois, a três, com penetração e outras práticas. 

Outrossim, se estes desenhos fogem aos padrões usuais com cenas de sexo entre humanos e animais, pessoas do mesmo sexo e crianças, não há nada que possa qualifica-la como obra de arte. Ficam no mesmo nível ou pior no caso da zoofilia. Muitas crianças nas regiões agrícolas, onde o convívio com os animais é próximo praticam esses atos de zoofilia. Mas, qual a necessidade de expô-los?

Diga-se de passagem que há anos filmes e fotos dessas relações sexuais, com animais, com pessoas do sexo posto ou do mesmo sexo, com diversas pessoas participantes (conhecida como suruba) são expostos em lugares reservados, sem exposição pública. 

Por isso a originalidade, o talento e o trabalho inexistem e a obra se resume ao ato de expô-los publicamente.

O mesmo se diga do “artista” que com uma imagem santa, destrói esta imagem, esfregando-a perto dos órgãos genitais, cobertos apenas com um pano, localizado exatamente no órgão.

Não há neste ato, como nos outros, nada de construtivo, mas destrutivo tanto artisticamente, como culturalmente. Para que uma atividade seja elogiada e apreciada como obra de arte,  deveria ter ou tem que apresentar algo construtivo. Como ser arte fosse o ato de destruir.

A nossa cultura é de uma sociedade religiosa, embora muitos possam optar pela falta de religião. E este preceito está previsto na Constituição, assim como no Código Penal, no seu artigo 208, que trata dos “CRIMES CONTRA ATOS RELIGIOSOS”.

“Escarnecer de alguém publicamente, por motivo de crença ou função religiosa; impedir ou perturbar cerimônia ou prática de culto religioso; vilipendiar publicamente ato ou objeto de culto religioso”.

O artista que ter o direito de se expressar, mas todo direito tem limites, e é regulado por lei. Não exista esta total liberdade de expressão, posto que a lei define os seus impedimentos e os modos de expressá-los. Quer se expressar não respeitando os sentimentos religiosos e morais dos outros, invadindo a privacidade do lar e da educação.

Escarnecer significa zombar ou ridicularizar alguém ou alguma coisa (Dicionário online); ironizar, zombar, achincalhar, caçoar, troçar (sinônimos.com.br).

Vilipendiar: destratar ou humilhar, tratar com desdém, menosprezar, ofender através de gestos ou ações. (sinônimos. com.br).

Portanto, deduz-se que todos os religiosos cristãos, assim com a Instituição Igreja Católica e demais crenças cristãs, estão sendo destratados, desrespeitados, achincalhados, zombados, ofendidos.

Sacrilégio significa profanação de lugares, objetos e pessoas que apresentam caráter sagrado ou o ato de desrespeito daquilo que é tido como sagrado (www.significados.com .br).

E profanar é ato de sacrilégio, mau uso das coisas dignas de apreço (Priberam), desrespeitar, ofender, macular.

“verbo que está relacionado com o faltar o respeito a algo religioso ou sagrado. Ao profanar, por conseguinte, desonra-se, ultraja-se uma coisa que, pelas suas características, merece respeito, em “Conceito de profanar”, https://conceito. de >profanar.

Quanto aos problemas culturais. Mostrei diversos exemplos da influência da cultura na arte, de forma construtiva e não destrutiva.

Lembro que ainda persiste em nosso Código Penal o Capítulo VI – DO ULTRAJE AO PUDOR”, cujos artigos 233 e 234 tratam do “Ato obsceno” e  “Escrito ou objeto obsceno”.

Art. 233 – Praticar ato obsceno em lugar público, ou aberto ou exposto ao público:

Sem comentários. Tudo a ver.

Conclusão

Não restam dúvidas que o gostar e a interpretação sobre criatividade e talento têm algo ou muito de "subjetividade". Somos a interação da cultura, dos neurônios e de experiências individuais, sem falar na sinapses, no inconsciente e na genética. 

Parafraseando Eagleman: "a realidade é uma construção do nosso cérebro" (p. 39) e "para ver, não basta ter olhos" (p. 44), comparável ao antigo provérbio "cada um ver o que quer", que traduzido hodiernamente seria "cada um ver o que o seu cérebro permite" Os nossos órgão sensoriais cumprem a missão de enviar informações aos neurônios, transformadas em sinais eletromagnéticos, que são processados pelo cérebro, pela interação de diversos "órgãos" que o compõem. 

Podemos não gostar, uma manifestação particular, porque tal fato nos remete para situações que vivenciamos, ou por qualquer outro motivo (as cores não me agradam), mas o importante é saber separar este não gostar do saber-reconhecer a criatividade e o talento. 

Se a "realidade" não corresponde ao que se vê, acredito que sempre haverá espaço para a arte figurativa, porque podemos retratá-la sob diversas formas e técnicas, conforme se pode constatar pelas diversas formas de representação na história da arte (classicismo, barroco, impressionismo, expressionismo, pop). 

E haverá sempre algo de "misterioso" no ser humano, da sua personalidade, da sua loucura, da sua desrazão e "alma", inseparáveis do seu comportamento, que nos fascina e que poderá ser retratado pelo  artista, de acordo com a sua "realidade".  Também a natureza pode ser retratada com criatividade e talento, como bem nos mostraram Monet e Cezanne. 

O ser humano pode não ser o centro do Universo mas será sempre o centro da cultura, da história e do seu próprio destino. Sem ele não há história nem cultura, ele é o criador. E é isso que o distingue das demais espécies. 

A "morte" temporária da arte figurativa trouxe também consigo, em seu germe, de forma desmedida, a extravagância, a falta de bom senso, a ausência de estética, o "oportunismo" desenfreado. Mas a história da humanidade, à semelhança de um pêndulo, é também a história de estabelecer e romper conceitos, até que os novos padrões sejam estabelecidos e novamente rompidos. 

Não vamos ao radicalismo de também anunciar e querer a morte da arte abstrata, ou de qualquer outra que traga eu seu bojo a criatividade, o talento e o trabalho. Quero sim, a morte dessa arte que nada acrescenta, cujo objetivo é chocar para se firmar e que traz danos irreparáveis à sociedade.  

Outrosssim, é indubitável que estes verdadeiros gênios, acima citados, alguns com contribuições para a ciência, como Da Vinci, possuidores de uma originalidade, criatividade e talento incomuns, muito além dos seres normais, se submeteram a um trabalho exaustivo e árduo para apresentar as suas obras primas, que tanto nos impressiona e nos conquista após séculos ou décadas.

O que ainda não consegui entender e acredito que ninguém se convencerá disto com argumentos plausíveis é como um(a) cidadão(ã) pretende ser portador de uma genialidade tão imensa que precisará apenas apresentar uma ideia qualquer, mirabolante, para ser considerado um artista genial, digno dos maiores elogios e admiração, mais até do que os já citados, sem colocar à prova a sua competência, originalidade e o seu talento, enriquecidos e aprimorados pelo trabalho árduo.

Temos que admitir uma dessas hipótese e fazer uma opção:

1)ou somos uns verdadeiros idiotas e estamos sendo enganados há anos;

2) ou a genialidade destes novos pretendentes é muito superior a de seus antepassados e, por isso, não conseguimos entendê-los;

3) ou, então, são uns verdadeiros charlatões, que se auto-intitulam gênios e que por isso não precisam trabalhar para comprovar as suas supostas genialidades. E estão a nos ludibriar.

Das três hipóteses acredito que ninguém em sã consciência fará uma opção pelas duas primeiras.

Na realidade esses novos protagonistas são tão descarados que circulam com a maior desenvoltura e com uma aura de super-gênios, sem quaisquer constrangimentos e até se ofendem de não serem tratados e admirados como tal. Estão a praticar uma outra arte, a do convencimento e parece que estão sendo bem sucedidos.

O momento atual é de uma crise profunda da arte, dos valores sociais, com um desprezo pelo trabalho, principalmente em relação àquelas pessoas que se dedicam com esforço e zelo a uma atividade profissional, construindo e contribuindo, para no final levarem para casa a recompensa de seus esforços.

Esta arte, para mim e acredito para tantos outros, é a arte daqueles que não têm talento e não querem trabalhar, dos preguiçosos e enganadores, que possuem se utilizam do despudor, que muitos do passado não tiveram, para chocar e agredir a sociedade e a própria arte. São os assassinos da arte.

Pessoas totalmente despreparadas, sem talento e criatividade, que vivem na sombra do que acreditam ser, ludibriando, enganando e tomando os espaços daqueles que querem contribuir e têm os atributos para tal. As suas artes não são  belas nem construtivas, padecem do mal e do vício da preguiça, pois a falta de criatividade e talento não são vícios.

Não estamos interessados em seus nudismos porque também sabemos fazer nos despir, com a diferença de ser nos momentos apropriados, nem em cenas de sexo de mal e mau gosto, porque também sabemos fazer isto e existe uma infinidade de revistas muito mais interessantes e talentosas. São tão desprovidos de qualquer talento que nem mesmo sabem explorar a sensualidade do corpo.

Toda sociedade, por mais elementares, possuem códigos morais, éticos, legais e algumas religiosos que são as ligaduras que lhes dão consistência para existirem como sociedade. Estes códigos mudam, se transformam, por diversos motivos.

Mas para se transformarem não precisam ser vilipendiados, ridicularizados e negativamente agredidos, sob pena desses elos sociais se romperam e ameaçarem a sobrevivência social.

Como tudo na vida existem transformações (com letras minúsculas) e “TRANSFORMAÇÕES”, sendo estas últimas as que dignificam a existência do ser humano.

Não admiro esta “arte” por que:

1)    sei fazer o que eles fazem, se duvidarem, melhor e com mais elegância;

2)    meus códigos não permitem e tenho filhos e netos;

3)    e o mais importante: felizmente tive a oportunidade de ver, aprender, admirar uma “verdadeira” arte, de conteúdo inegavelmente superior, em todos os aspectos, mais bonita, que não me traz repulsa, que encanta aqueles que não só aprenderam, desenvolveram e adquiriram, mas que também nasceram com o senso do ridículo e do bom gosto;

Quero que seja transmitida para as crianças, que ainda não possuem o amadurecimento emocional e intelectual suficientes, uma arte educativa e construtiva, de acordo com os códigos legais, morais e éticos, que respeite a religiosidade das outras pessoas e que não me traga repulsa.

Permitam-me transcrever uma parte do livro “NEURO ECONOMIA”, o Capítulo 6, tópico “cérebros: adolescentes e adultos”, de José Eduardo Carvalho. É interessante e instrutivo:

“Os comportamentos superiores (atitudes), incluindo as funções de aprendizagem e de conhecimento, fazem intervir um nível de organização superior aos instintos e dos afetos – o neocortex. Aqui fazemos nossos juízos de valor sociais, ponderamos opções, planeamos futura e avaliamos nosso comportamento. Segundo Jay Gield, cientista na área de neuroimagiologia, do Instituto Nacional para a Saúde Mental dos EUA, este <<cérebro executivo>> é o último a alcançar a maturidade, não atingindo o nível adulto antes dos 25 anos. Durante a puberdade, temos paixões , desejo sexual, energia e emoções como um adulto, mas o controlo destas emoções só acontece muito mais tarde. Talvez não seja de admirar que os adolescentes careçam de capacidade para ajuizar por si mesmos ou para refrear os impulsos. Nos EUA os jovens voltam aos 18 anos, mas só podem alugar um automóvel aos 25 anos.

[...] O cérebro do adolescente é diferente do cérebro do um adulto. Os adultos usam o córtex-frontal para processar a informação. Um córtex-frontal activo é sinal de maturidade emocional e inteligência. Os adolescentes utilizam uma parte mais antiga do cérebro – a amígdala – para processar  a informação. A amígdala, uma pequena região do sistema límbico, foi uma das primeiras estruturas a desenvolver-se à medida que o cérebro evoluiu. É onde estão as reações instintivas, como a raiva e o medo. Quando estimulada eletricamente os animais respondem com agressão”, p .136.

Ainda sobre o assunto cito David Eagleman, em "O cérebro":

"Para além do desconforto social e da hipersensibilidade emocional o cérebro do adolescente esta configurado para correr riscos. Seja conduzir a alta velocidade ou enviar mensagens com fotos de nus, os comportamentos de risco são mais tentadores para o cérebro do adolescente do que para o cérebro do adulto" (p.23).

Portanto, para estes artistas que tanto gostam de aparecer nu publicamente, incluindo crianças, com um rótulo de arte (não falo em revistas para adultos), ao que tudo possa indicar, trata-se um problema neurológico, talvez reforçado por algum "mecanismo" psíquico, freudiano.

Mas, por mais que venham a ser problemas de ordem neurológicas ou psíquicas, a convivência em sociedade exige regras, leis, sob pena de se romperem os elos sociais. 

Por este motivo, nos países com uma legislação mais evoluída existem normas de proteção à criança e ao adolescente. No Brasil, além do Código Penal, elas estão normatizadas no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). No seu artigo 1º está dito:

“Esta lei dispõe sobre a proteção integral à criança e ao adolescente”.

Mais especificamente nos seus artigos 240, 241, 241-A, 241-B, 241-C, 241-D, 241-E, estão normas que protegem as crianças e os adolescentes da exposição ao sexo.

No mesmo sentido (de proteção ao menor) normatiza o Código Penal no capítulo “DOS CRIMES SEXUAIS CONTRA VULNERÁVEL”, cujo artigo 217-A reproduzo:

“Ter conjunção carnal ou praticar ato libidinoso com menos de 14 “catorze) anos:

Pena: reclusão, de 8 (oito) a 15 (quinze) anos.

Não pretendo entrar em mais comentários legais sobre este assunto, porque os leitores poderão consultar a legislação, bem como os comentários e as decisões judiciais sobre o assunto. E este não é o objetivo imediato deste artigo.

Ora, vamos discutir o assunto com base em estudos científicos e porque não também com base nos princípios éticos, morais e legais? Afinal de contas crianças e adolescentes estão sob a tutela dos pais, não fazem leis, não ditam normas de comportamento, embora possamos e devamos ouvi-los, para melhor protege-los, ajudá-los nos seus anseios e a desenvolver um espírito cooperativo, base de todas as sociedades, por mais contradições que nela possam existir.

E porque não levarmos em consideração os aspectos religiosos, enquanto eles participam da construção ética, moral e legislativa da sociedade? Onde existem os feriados religiosos, que todos adoram e a Constituição (Carta Magna) garante a “Liberdade de expressão” (manifestação de pensamento) e a “Liberdade de consciência, crença e culto”, previstos nos incisos IV a VIII, do artigo 5º.

VI – “ É inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livro exercício dos cultos religiosas e garantia, no forma da lei, a proteção aos locais de culto e as suas liturgias”.

Citando Rui Barbosa: “Fora da lei não há salvação”. Que se mude a lei, mas não agredindo de forma vã e vulgar os padrões sociais. 

Também por uma questão ética, moral, legal, enfim de “princípios” lógicos, quero para elas (crianças) uma arte que aprendi a admirar, que está acima das minhas capacidades intelectuais em realiza-la e da grande maioria dos mortais.

Uma arte que constrói e dignifica o ser e a existência humana, na qual exista criatividade, originalidade, talento e muito trabalho, que junto dos códigos éticos, morais e legais, são os atributos que diferenciam o “ser humano”.

Uma arte construtiva e não destrutiva, que reforce os elos sociais, mesmo modificando-os quando necessário, que sirva de exemplo, que nos traga orgulho, glorifique e dignifique a existência humana. Uma sociedade não sobrevive sem trabalho, quer gostemos ou não, pois esta é a sina humana.

Então, que este trabalho seja adornado com criatividade e talento, enfim elevado às condições que nos distinguem, para que sejam aliviados os fardos da vida.

Depois de assistir tudo isto, diante dessa essa avassaladora investida anti-artística, que a quase todos choca, não deixa de vir à minha mente o "Poema das sete faces", de Drummond:

"Mundo mundo vasto mundo/ se eu me chamasse Raimundo/ seria uma rima, não seria solução/ Mundo mundo vasto mundo/ mais vasto é o meu coração".

Proposta 

Diante de tanta insensatez, para finalizar vou propor uma arte mais radical, chocante e agressiva.

Vou propor a um museu colocar um vaso sanitário ou pinico no centro e contratar um artista "interativo", para, na medida do possível, fazer suas necessidades fisiológicas a vista do público, inclusive crianças.

Depois as crianças, ou quem quiser, poderão entrar em uma fase interativa com os excrementos do "artista", tocando-os, amassando-os, cheirando-os e quem sabe no final as crianças, depois de sentirem todas essa sensações "tão especiais" para a arte, poderão esfregá-los na cara do artista. 

Afinal os antigos também cagavam e as crianças, na tenra idade gostam de brincar com merda, espalhando-a e compartilhando. Esclareço, desde já, que qualquer proposta semelhante considerarei plágio e entro com uma ação de danos.

Quero ganhar honestamente com este talento que Deus me deu, participando dos ganhos do artista ou do museu, já que a lei me protege e me permite a liberdade de expressão.