terça-feira, 2 de junho de 2015

DESENVOLVIMENTO E LIVRE COMÉRCIO - Uma perspectiva cultural


DESENVOLVIMENTO E LIVRE COMÉRCIO

( o desenvolvimento sob uma perspectiva cultural)




Objetivo

O debate entre os partidários do livre comércio e intervencionistas sobre o desenvolvimento econômico ainda não terminou, por sinal, recomeçou e ganhou novas dimensões.

Com o "relativo fracasso" do modelo de substituição de importações os debates vieram novamente à tona.

Digo "relativo fracasso" porque ainda não existe um estudo aprofundado, um balanço definitivo, que demonstre se houve realmente fracasso total ou se foram obtidos ganhos, mesmo com desperdícios.

Na verdade, um veredito sobre o assunto parece um tanto improvável porque a história não se escreve com o "se" e, assim sendo, fica difícil avaliar e fazer conjecturas conclusivas sobre novos contornos e situações que não aconteceram.

Tornou-se um "fracasso" porque não conseguiu alcançar os objetivos traçados, almejados e esperados, muito embora estejamos longe de realçar alguns dos aspectos positivos, se é que existiram. Foi uma tentativa que infelizmente nâo deu certo, por falha de programação e por motivos culturais.

Ao longo do trabalho, terei oportunidade de expor que o sucesso do processo de desenvolvimento não repousa apenas em motivos estritamente econômicos, mas também em fatores sociais, políticos, culturais e ideológicos.

Espero conseguir demonstrar que o fracasso do modelo de substituição de importações adotado pelo Brasil não siginifica a vitória inquestionável do livre comércio como motor necessário para alcançar o desenvolvimento.

Este breve artigo é uma tentativa de demonstrar a impossibilidade teórica de se alcançar o desenvolvimento econômico através da livre circulação de mercadorias (livre comércio) e livre movimentação do capital.

Em tópico específico faço comentários sobre a impossibilidade do processo de substituição de importações, por si só, alcançar o desenvolvimento econômico. Os argumentos são basicamente oas mesmos.

Este trabalho está dividido nos seguintes tópicos: 1) o conceito de país desenvolvido; 2) Os primórdios do liberalismo; 3) Produção e circulação (capital produtivo, mercantil e financeiro; 4) a substituição de importações (PSI) como etapa para o desenvolvimento; 5) Conclusão.




O CONCEITO DE PAÍS DESENVOLVIDO

O conceito de país desenvolvido ou "subdesenvolvido" (não vou entrar na polêmica sobre o termo) sempre foi um percalço para os estudiosos, mormente os economistas.

Isto, porque os parâmetros que os definem sempre foram relativos e somente em conjunto adquirem relevância, para se analisar em concreto uma dada situação.

Além dos tradicionais parâmetros como renda per capita, qualidade de vida, escolaridade, infraestrutura, marginalidade da população (acesso ao mercado), percentagem de atividades agrícolas, pauta das exportaçõs e importações, inchaço de um terciário retógrado, outros no decorrer dos anos, por motivos concretos, foram sendo adicionados: instituições frágeis, judiciário moroso, parque industrial diversificado, atividades industriais preponderantes, setor de bens de capital diversificado e dinâmico.

Os conceitos são relativos e só adquirem importância quando analisados conjuntamente em concreto.

Não bastasse isto, acredito ser possível admitir que um país seja cultural e socialmente desenvolvido e modermo, sem que possua um parque industrial bastante diversificado e avançado. Isto se aplica àqueles países de pequenas dimensões territoriais e com pequenas populações, como seria o caso de alguns países europeus. Ou seja, em outras palavras, um país culturalmente desenvolvido, aberto para as inovações, sem no entanto possuir um desenvolvimento econômico correspondente.

Mas, ao contrário, um país economicamente desenvolvido, com um setor de bens de produção (PI) diversificado e dinâmico, leva indubitavelmente a um desenvolvimento cultural. Um PI capaz de criar produtos de consumo, meios de produção e métodos de trabalho que introduzam e ditem o modo e o estilo de vida da população, em resumo tecnologia de produtos e serviços. Neste caso, teríamos um país desenvolvido sobre todos os aspectos.

Desse modo, torna-se evidente que aos países com grandes dimensões territoriais e populacionais não se pode aplicar os mesmos critérios de avaliação. Nestes, um parque industrial diversificado, com um PI dinâmico, autóctone e ao mesmo tempo aberto, não xenófobo, e criativo (inovador), aliado aos outros parâmetros mencionados, é de suma importância para definí-los como desenvolvidos.

Em suma, é incontestável que um país de granes dimensões que não preencha estes requisitos, tomados em conjunto, não pode ser classificado como desenvolvido.

Este é o caso do Brasil. Um país com um parque industrial diversificado, mas que não consegue imprimir a sua marca, com referência e em relação a sua expansão territorial e populacional. Um parque industrial dominado por empresas multinacionais que não criam, apenas reproduzem aqui o que suas matrizes determinam e criam. Enfim, um país importador de tecnologia, de bens de consumo e capitais novos, que moldam o estilo de vida de sua população, e exportador principalmente de produtos primários ( em torno de 70/75%).

Ao longo do artigo, terei oportunidade de citar outros aspectos culturais e ideológicos, enraizados na nossa cultura, assimilados por nossa herança colonial "portuguesa", que entravam o desenvolvimento do país.




OS PRIMÓRDIOS DO LIBERALISMO

Não há dúvidas de que a doutrina do liberalismo é uma invenção inglesa, que acontece com o surgimento da revolução industrial, cujo berço foi a Inglaterra.

Entretanto, ela surge quando a Inglaterra já ocupa uma posição dominante na economia mundial, ou melhor quando as estruturas do capitalismo já se encontram plenamente fincadas na sociedade, gozando a mesma desta primazia.

Ora, não deixa de ser estranho que esta doutrina esteja vinculada a um domínio econômico e que, por este motivo, beneficiava a economia inglesa em comparação a outras economias nacionais que ainda não tinham alcançado a modernidade tecnológica inglesa.

É importante ressaltar este paradoxo, porque a acumulação primitiva do capital, considerada fundamental para o surgimento do capitalismo, como modo de produção, se deu as custas de pilhagem interna e externa, colonialismo e bloqueio ao livre comércio.

"A fase de acumulação primitiva é conhecida por pilhagem interna (da própria população dos países centrais) e/ou externa (contribuição da periferia na acumulação primitiva). O primeiro modelo foi bem explicado por Marx, porém o segundo foi subestimado pelo autor de O Capital.

De acordo com Benakouche (1980, p. 40), a pilhagem externa foi de grande importância para a consolidação do modo de produção capitalista". (Acumulação primitiva de capital, em www.eumed.net/...).

Esta conclusão também pode ser tirada dos comentários de Marx sobre a Companhia das Índias Orientais, que se instalou na Índia e estabeleceu políticas econômicas, inclusive militares, de interesse da Inglaterra:

" Pouco a pouco, os partidários da Companhia das Índias Orientais tornaram-se mais audaciosos e pode-se notar, como uma curiosidade nada estranha nessa história indiana que os monopólios do comércio na Índia foram os primeiros apóstolos do livre cambismo na Inglaterra.

Novamente a intervenção parlamentar foi reclamada com respeito da Companhia das Índias Orientais, não pelo pessoal do comércio, mas pela classe industrial em todo o decorrer dos últimos anos do século XVII e durante a maior parte do XVIII; foi então proclamado que a importação de tecidos de algodão e de sedas das Índias Orientais arruinariam as pobres manufaturas inglesas.

O Parlamento interviu então. Pelos atos 11 e 12 Guilherme III, capítulo 10, o porte de sedas manufaturadas e de peças impressas ou tingidas, importadas da Índia, daPérsia e da China, foi proibida e toda pessoa que as possuissem ou vendessem eram passíveis de uma multa de 200 libras esterlinas. Leis análogas foram promulgadas sob George I, II e III em consequência das lamentações reiteradas dos manufatureiros britânicos, tão "esclarecidos". Assim, durante a maior parte do Século XVIII os produtos manufaturados indianos foram geralmente importados pela Inglaterra para serem vendidos no continente, estando excluídos do próprio mercado inglês." (em A Companhia das Índias Orientais: sua História e as Consequências de sua Actividade - Karl Marx, junho de 1953) .

Em decorrência desta política "liberal" a Inglaterra conseguiu aniquilar a produção manufatureira local, inundando o mercado indiano de produtos manufaturados ingleses, alavancando a revolução industrial.

"Durante todo o século XVIII os tesouros que afluiam da Índia para a Inglaterra eram bem menos o fruto de um comércio comparativamente insignificante do que da exploração direta deste país e das fortunas colossais que lhe eram extorquidas e transferidas para a Inglaterra. Em pouquíssimo tempo, após 1813, o comércio com a Índia mais que triplicou. Mas isso não era tudo. O caráter deste comércio tinha mudado. Até 1813 a Índia tinha sido principalmente um país exportador, tornando-se agora importador, e essa progressão foi tão rápida .... A Índia, o grande atelier do cotonifício para o mundo desde tempos imemoriais, se encontrava agora inundada de fios e de tecidos de algodão ingleses. Com seus produtos excluídos da Inglaterra, ou admitidos somente sob as mais duras condições, ela agora via afluir para dentro de sua economia os manufaturados ingleses, gravados de um direito módico, puramente nominal, para a ruína de sua indústria de algodão outrora tão célebre"(idem).

E o assunto não se resume nisto. Pelo Tratado de Methuen, datado de 1703, Inglaterra e Portugal assinaram um acordo em que o primeiro se especializaria na produção de tecidos e o segundo no fornecimento de vinhos para o primeiro.

Embora o assunto seja polêmico quanto a importância do Tratado para a decadência econômica de Portugal, que já se anunciava há tempos, parece inquestionável que o acordo coroa a submissão deste país à Inglaterra, posto que contribuiu para travar o desenvolvimento de outras atividades manufatureiras. As condições desvantajosas do acordo fez com que Pombal tentasse reverter a situação, no que foi impedido pela aristocracia.

Interessante é que mais de cem anos após a assinatura do Tratado David Ricardo elabora a sua teoria de custos comparativos, demonstrando as vantagens de cada país se especializar na produção e comercialização de determinados tipos de produtos, para quais possuia vantagens econômicas. Sobre o assunto, consultar neste site "A ideologia das vantagens comparativas" em www.melisiofrota.blogspot.com.br.

Este fato, mostra que a teoria econômica sempre vem a reboque das situações políticas e comerciais, servindo muitas vezes apenas para justificar as práticas já consolidadas.

No entanto, convém mencionar que esta teoria se enrraizou na cultura e na elite brasileira, dando, enfim, a sua contribuição para dificultar uma escolha alternativa política para o desenvolvimento.

Cabe mencionar que não só a Inglaterra incorreu neste paradoxo ideológico. Também os Estados Unidos da América após adotarem uma política expansionista e não liberal abraçaram a teoria liberal, como ferramenta de sua política externa, principalmente depois que os estrondos dos canhões dos países europeus jogaram suas economias para uma posição secundária.

Sobre a expansão do capitalismo inglês cito José Luiz Fiori:

"O milagre econômico inglês, que deu origem ao capitalismo moderno, começou no século XVII, muito antes da chamada Revolução Industrial..... portos ingleses aos navios estrangeiros e se transformou no primeiro ato mercantilista agressivo da Inglaterra fechando as fronteiras de sua econmia nacional.... Ao mesmo tempo, no cam po econômico, promoveu uma fusão revolucionária das instituições financeira holandesas - que eram mais avançadas - com as finanças inglesas, criando o Banco da Inglaterra e um novo sistema de financiamento da dívida pública inglesa atrelado à bolsa de valores e ao sistema de crédito da banca privada (em "História, Estratégia e Desenvolvimento", capítulo "O Desenvolvimento Inglês", Boitempo Ed., 2014, p.78)

v) o próprio protecionismo de Cromwell se manteve até o século XIX , e só foi abandonado depois que a inglaterra já era potência militar e econômica mundial ( p. 69)

Agora bem: o que é importante destacar é que por trás da ficção ideológica liberal, o modelo de desenvolvimento econômico da Inglatterra foi sempre expansivo e agressivo, e foi construído à sombra do movimento de projeção do poder do Estado inglês, dentro e fora da própria Inglaterra, segundo a estratégia proposta pela economia política clássica de William Petty" (idem p. 70) .

O mesmo se diga sobre o desenvolvimento americano, que não se deu sob a égide do liberalismo:

ii) o sucesso do capitalismo americano não foi puramente endógeno, nem a apenas um obra das grandes corporações e do capital financeiro que nasceram à sombra da guerra civil;

"iv) a guerra contínua teve um papel estratégico no desenho da política industrial e agrícola, e no desenvolvimento científico e tecnológico;

v) e por fim, a expansão política, territorial e bélica dos Estados Unidos foi à frente do processo do processo de internacionlização das grandes corporações, do capital financeiro e da moeda americana (Fiori, em "O capitalismo americano", p.73)

Ambos incorreram em guerras expansionistas e estabeleceram colônias além mar. Com a doutrina Monroe os Estados Unidos estabelecem a sua política de influência nas econiomias americanas.


PRODUÇÃO E CIRCULAÇÃO (CAPITAL PRODUTIVO, MERCANTIL E FINANCEIRO)

Inicio este tópico reproduzindo texto de Karl Marx, em Introdução a Economia Política, letra c, Troca e Produção:

"A circulação propriamente dita ou não é mais do que um momento determinado da troca, ou é a troca considerada em sua totalidade.

Na medida em que a troca não é mais do que um momento mediador entre, por um lado, a produção e a distribuição que aquela determinae, por outro lado, o consumo - e dado que o próprio consumo aparece também como um momento da produção - é evidente que a troca se inclui na produção, e é também um seu momento.

Em primeiro lugar, é evidente que a permuta de atividades e capacidades que ocorre no interior da produção faz diretamente parte desta última - é até um de seus momentos essenciais. Em segundo lugar, o mesmo se aplica à troca de produtos, pois esta é um meio que permite fornecer o produto acabado, destinado ao consumo imediato. No que até agora vimos, a troca é um ato incluído na produção. Em terceiro lugar, a chamada exchange entre dealers é, dada a sua organização, completamente determinada pela produção; representa uma atividade produtiva. Somente na sua última fase - no momento em que o produto é trocado para ser consumido imediatamente - é que a troca se apresenta independente e exterior à produção e, por assim dizer, indiferente a esta. Porém observamos que: 1) não existe troca sem divisão do trabalho, quer seja natural, quer seja um resultado histórico; 2) a troca privada pressupõe a produção privada; 3) a intensidade da troca, assim como a sua extensão e a sua estrutura, são determinados pelo desenvolvimento e pela estrutura da produção.... Portanto, a produção compreende e determina a troca em todas as suas formas.

A conclusão a que chegamos não é de que a produção, a distribuição, a troca e o consumo são idênticos; concluimos, sim, que cada um deles é um elemento de um todo, e representa a diversidade no seio da unidade. Visto que se determina contraditoriamente a si própria, a produção predomina não apenas sobre o setor produtivo, mas também sobre os demais elementos; é a partir dela que o processo sempre se reinicia. É evidente que nem a troca nem o consumo podem ser os elementos predominantes. O mesmo se verifica em relação à distribuição tomada como distribuição dos produtos.

Para uma crítica da economia política de produção, ela é um momento da produção. Por conseguinte, uma dada produção determina um dado consumo, uma dada distribuição e uma dada troca; determina ainda as relações recíprocas e bem determinadas entre esses diversos elementos. Sem dúvida que a produção em sentido estrito é também determinada pelos outros elementos. ... Por último, as necessidades de consumo influem na produção.

O que podemos extrair deste texto, para os nossos propósitos, é que o capital produtivo, mercantil e financeiro são as formas que o capital adquire no seu processo de valorização. No entanto, o capital mercantil encontra-se "limitado", por assim dizer, pelo capital produtivo.

Este capital mercantil não cria valor, apenas faz circular e distribuir os produtos, que se tornam mercadorias. Estão, portanto, limitados à produção. O produto torna-se mercadoria, mas a mercadoria já é um produto transformado em mercadoria.

Dessa forma, o circuito mercantil do capital está alicerçado nas relações de produção, que por sua vez, contêm uma relação política de poder (distribuição do bolo) e uma relação ideológica, que dão coesão ao modo de produção.

A circulação e a distribuição se dão em relação aos produtos que foram produzidos e não em relação aos produtos que ainda nem sequer foram concebidos. Nesse sentido a circulação e a troca não podem criar as condições materiais necessárias à produção. Podem, sim, quando muito, comprometer a produção de produtos passíveis de produção.

Por ser apenas uma etapa de valorização do capital, a circulação de mercadorias não tem o poder de criar ou agregar valor aos produtos nem eliminar os obstáculos que estão presentes no processo produtivo.

Caso ocorresse a mobilidade elevada do capital, o que não é o caso, seria mais provável que este capital mercantil se deslocasse para o setor de substitução de importações, porque o risco do negócio seria menor, já existia uma demanda a ser atendida, os processos de criação e desenvolvimento dos produtos já foram efetuados, os problemas de infraestrutura para a pesquisa, invenção e inovação são menores ou inexistentes e, portanto, mais fáceis de serem resolvidos.

Esta etapa de circulação permite apenas, em condições sociais e econômicas muito peculiares, dependendo inclusive da capacidade e aptidão empresária para o risco, que se dê um deslocamento preliminar para o processo de substituição de importações no setor pordutivo, cuja dinâmica fica atrelada a importação de bens de capital e a capacidade em adquirí-los.

Por este motivo, o mais provável e lógico é que a industrialização de um país subdesenvolvido, sujeito à política do livre comércio, se dê através do processo de substituição de importações. Foi o que sucedeu no final do século XIX, com a produção industrial de bens de consumo, antes importados.

Daí, que o processo de substituição de importações, em si, não é capaz de alavancar o setor produtivo de bens de capital e de novos produtos e processos produtivos, mas apenas de acelerar a industrialização, na esperança e expectativa de que no futuro, por um passe de mágica, este setor adquira as condições dinâmicas para autogerar novos processos produtivos e inovações, capazes de comandar o processo de desenvolvimento.

Admitir que a troca e a circulação de mercadorias são capazes de criar condições para a inovação, invenção e produção de novos produtos e tecnologia é inverter as relações determinantes de cada etapa do capital.

Ora, a produção, ou seja o capital produtivo, para se realizar e prosperar de forma dinâmica encontra limites na estrutura social (cultural), econômica e política e o capital mercantil não é capaz de eliminar os obstáculos e as amarras que se impõem na esfera produtiva. Ele não resolve nem elimina os obstáculos ligados a escolaridade, infraestrutura, gargalos da economia, porque a sua função, simplesmente não é esta e, sim, fazer circular e distribuir o que foi produzido ou o que pode ser produzido, porque já concebido em determinadas condições materiais e passível de ser produzido.

O processo de desenvolvimento requer não só medidas econômicas, mas também políticas de cunho social e ideológico, enfim compromissos gerais da classe dirigente (política, empresária), da intelligentsia e da população, com um projeto desenvolvimentista.

Um dos grandes desafios neste processo, é que torna-se impossível transformar emoções, sentimentos, conexões sociais, valores que estão enraizados na cultura e no espírito do povo, em variáveis econômicas quantificáveis.

Estes fatores, valores sociais e psico-sociais têm relevância no mundo econômico, mas não podem ser captados por modelos por serem incomensuráveis os seus efeitos sobre as varáveis e atividades econômicas. São um imput de que necessitam as atividades econômicas para alcançar seus objetivos, moldando-as dentro de possibilidades práticas e políticas.

Valores como perseverança, determinação, esperança, eficiência, patriotismo (compromissos sociais), auto-estima, ambição, coesão cultural, ideologia, criatividade, predisposição para o risco, etc, são os ingredientes indispensáveis para fazer com que o país possa trilhar o caminho do desenvolvimento econômico.

Sobre a influência desses fatores na cultura do país ver "A ideologia das vantagens comparativas", tópico 6ª Consideração, "O imigrante", em www.melisiofrota.blogspot.com.br, onde menciono:

"O imigrante traz consigo um ideário de vida, hábitos, amor próprio, autoestima, ambições, preconceitos, desejos de liberdade, espírito empreendedor, que são próprios de sua sociedade e que tentarão reproduzir no novo país. Estes comportamentos (acrescento: para se reproduzirem ou não) irão depender das condições materiais que irão encontrar nas novas sociedades.

E Portugal já era um país de segunda ou terceira ordem no cenário internacional. Qual o ânimo deste povo imigrante, os seus anseios, as suas aspirações? Em que se espelhavam?

Poderíamos acrescentar a predisposição para o risco, fundamental para a dinâmica de uma sociedade em constante transformação, como a capitalista.

É de suma importância que a classe dirigente não esteja comprometida e impregnada com a ideologia do livre comércio e das vantagens comparativas como motores do desenvolvimento. Com isto, evita-se desempenhar um papel secundário no processo produtivo, ao ocupar os espaços econômicos pré-determinados pela divisão internacional do trabalho, com sérias repercussões sobre a auto-estima social.

E que o risco do empreendimento não esteja atrelado ao que já existe e possa ser substituido, como no processo de substituição de importações, mas um compromisso com o devir, com o processo criativo, que poderá ou não moldar os novos costumes da sociedade.

Cito José Luiz Fiori:

"Entretanto, desde sua independência os Estados Unidos foram governados por uma elite coesa e com um intense commitment imperial, e mantiveram um ritmo de expansão política e territorial contínua por meio da guerra, da diplomacia e do comércio" (em "História, Estratégia e Desenvolvimento", capítulo "O capitalismo americano", Boitempo ed, 2014, p.72)

Em cada etapa do processo de valorização do capital existe funções específicas e determinadas a serem cumpridas por agentes econômicos a elas vinculados.

Portanto, dando consistência a estas funções específicas estão os agentes econômicos com seus hábitos e costumes profissionais, expertise, feeling, percepções de risco, familiarização com os procedimentos, que cada etapa requer e que, de certa forma, inibem as expertises e as habilidades requeridas por outras atividades.

Por este motivo, o capital não tem esta mobilidade surpreendente que o faça preencher todos estes espaços de forma independente. De ser capital financeiro ou mercantil e de repente se transmudar em capital produtivo, sob uma mesma perspectiva administrativa, de comando e propriedade.

O que pode ocorrer é a integração dessas diferentes formas (esferas) em conglomerados sob a direção de um segmento, financeiro ou industrial, dificilmente mercantil, que comanda o processo de acumulação e dá maior consistência às decisões econômicas, dependendo das realidades políticas e sociais de cada país, como os Zaibatsu e posteriormente os Keiretsu, que originariamente remontam a reestruturação Meiji.

Mas a formação destes conglomerados não impediu a crise imobiliária do Japão nem a crise financeira que se abateu na àsia em 1997/8, incluindo a Coréia do Sul. O que confirma a relativa independência das esferas econômicas (produção, circulação, sistema monetário), umas em relação às outras.

Esta integração se dá também numa etapa posterior do capitalismo através da concentração e centralização do capital, que culmina numa nova fase de capitalismo monopolista, com as suas respectivas nuances políticas que dão novos contornos à concorrência, como salientaram os diversos autores marxistas (Lenin, Bukarin, Hilferding).

Mas isto não que dizer que estas novas formas sejam capazes de alavancar o processo de desenvolvimento, bem como de eliminar as crises destas sociedades. Os problemas de integração continuam, as dificuldades de suplantar problemas de infraestrutura e culturais persistem e o capital se reproduz de acordo com as possibilidades encontradas.

Este capital de empréstimo não se desloca para o setor produtivo a fundo perdido, mas tem que ser remunerado, mesmo que esteja sob comando de um conglomerado, para dar coesão ao sistema e não gerar prejuízos para os investidores e correntistas, que devem ser remunerados pela taxa de juros vigente, inclusive por questões institucionais.

Esta remuneração irá depender do sucesso ecomômico do empreendimento para o qual o capital foi destinado. E o sucesso do capital produtivo em remunerar o capital financeiro irá depender das condições materiais de sua reprodução, que encontra entraves estruturais econômicos e cultuarais, como foi salientado.

O conglomerado não elimina o problema de mobilidade do capital, principalmente no que tange ao desenvolvimento econômico. Mesmo sob o comando de um conglomerado, o capital financeiro tem que cumprir as suas funções específicas, e por isso, não tem o poder de comandar o processo de desenvolvimento. Este processo se dá primordialmente na esfera produtiva, desempenhando esta uma função determinante, conforme Marx.

O processo de desenvolvimento econômico é uma conquista social e não se dá através de decisões particulares, individuais, de pessoas ou grupos econômicos, com interesses imediatos em explorar as possibilidades de lucro. Exige comprometimentos das elites, política e empresária, da intelligentsia e dos demais classes com o futuro.

Este fato (imobilidade do capital) ocorre até mesmo dentro de um mesmo setor produtivo. Esta é a razão porque a elite cafeeira não foi responsável pelo início do processo de indistrialização da economia brasileira (consultar "A ideologia das vantagens comparativas" em www.melisiofrota.blogspot.com.br).

Desde os seus primórdios coube ao capital "financeiro" o papel de fornecer fundos tanto ao capital produtivo quanto mercantil, através de uma concentração de dinheiro posta à disposição àqueles agentes que teriam dificuldades em adquirir fundos para desempenhar suas atividades (capital de giro e empréstimo). Esta seria a sua função básica: concentrar recursos financeiros (capital dinheiro) para serem colocados à disposição daqueles que necessitam. Posteriormente passaram a fornecer empréstimos ao consumidor.

O fato de em determinados momentos específicos da história este capital ter se transformado em capital verdadeiramente financeiro (Hilferding), associado a empresas não financeiras, não muda o caráter de suas funções específicas, pois são apenas formas de prover fundos e de melhor tirar proveito da administração para remunerar e garantir suas aplicações.

O mesmo se diga quanto aos bancos de investimentos que atuam em situações de alavancagem para fusão e aquisição de empresas e lançamento de ações na bolsa. Eles não assumem funções específicas de capital produtivo, mesmo que em determinados momentos tenham que assumir o controle administrativo de empresas endividadas.

O capital financeiro (e consequntemente o mercado financeiro), em razão de suas próprias características, notamente alta alavancagem e volatilidade, possibilidades de ganhos imediatos, reflexividade, mobilidade (transferências on line), operações com câmbio, volume movimentado, sensibilidade às questões políticas e política monetária, é propenso à especulação, para não dizer que é essencialmente especulativo, independentemente de ser partícipe de um conglomerado. Falo em especulação no sentido empregado por Kindleberger e Singer.

Não entro no mérito se a especulação é importante e necessária ao funcionamente e operacionalidade dos mercados financeiros, dando-lhes liquidez, principalmente na bolsa de valores, porque a bolsa também é especulativa, e caso a resposta seja afirmativa mais uma razão para que assim seja considerada.

Assunto corriqueiro:

"Nova York: seis grandes bancos US$ 6 bilhões mais pobres. E isso porque foram multados por manipular taxas de câmbio entre 2007 e 2013. Cinco instituições - Citigroup, JP Morgan Chase, Barcleys, The Royal Bank of Scotland e o suiço UBS - assumiram a culpa pelas irregularidades apontadas por autoridades americanas e britânicas. .... A infração é recorrente. Um total de US$ 9 bilhões em multas já foi aplicado a grandes bancos internacionais por manipulação do mercado de câmbio que movimenta US$ 5,3 trilhões por dia. ... Em novenbro, JP Morgan Chase, Citigroup, Royal Bank of Scotland, UBS e HSBC já haviam sido multados em US$ 4,2 bilhões" ( "OGlobo", Economia, p. 23, de 21.05.2015).

Com a transformação social e o surgimento dos conglomerados e do capitalismo financeiro "novas" funções adquiriram proeminência no circuito financeiro do capital, tais como: alavancagem para fusão e aquisição de empresas, mesmo hostis, através da bolsa, lançamentos de ações nas bolsas de valores, administração de fundos, subscrição e aquisição temporária de títulos e valores mobiliários para negociações futuras, repasses externos, empréstimos especulativos, hedges, swaps, securitização, etc. E estas atividades estão desconectadas dos compromissos com o desenvolvimento das atividades produtivas, especificamente falando.

Com as inovações financeiras as fronteiras foram alargadas e o circuito "estritamente" financeiro aumentou as possibilidades de ganhos especulativos, ou seja, dentro da própria esfera financeira.

Ele não está comprometido com o capital produtivo em todos os sentidos, mas apenas enquanto necessário para ser remunerado por suas aplicações. Possui a sua própria esfera de atuação, que possui vida própria em relação as demais formas, em busca de valorização de ativos financeiros, embora, de certa forma, a elas vinculado.

Por este motivo, não é de se estranhar que em determinados momentos da atividade econômica se desconectem das demais atividades, alçando vôos independentes que colocam em risco as atividades econômicas como um todo.

Reproduzo neste texto o que escrevi no artigo "A ideologia das vantagens comparativas", tópico 3º, "As características dos produtos e os modelos", postado no site www.melisiofrota.blogspot.com.br:

"Como corolário, o desenvolvimento tecnológico, as inovações e as invenções de novos produtos e processos necessitam dos conhecimentos previamente acumulados e materializados, da aprendizagem e, consequentemente da produção prévia de outros produtos, que passam a ser, em sentido figurado, algo como as "matérias primas" dos novos produtos tal como se tratasse de uma cadeia produtiva.

A aquisição de conhecimento e aprendizado, e a sua aplicação teórica e prática, é um processo eminentemente social, uma conquista social.

Sem qualquer menosprezo, os gênios só florescem em determinadas condições históricas e sociais, quando o desenvolvimento social e técnico permitem e viabilizam as novas descobertas. Elas são possíveis e se apoiam em aprendizados teóricos e práticos anteriormente acumulados, que fornecem os meios necessários para que as novas ideias desabrochem. Nessas circunstâncias as suas ideias encontram eco e promovem estímulos e novas descobertas.

Essa interface cria um ciclo vicioso, difícil de revertido por outras nações, mesmo por aquelas que inicialmente, antes, no início do processo, se encontravam em situações de desenvolvimento equivalentes, porque as vantagens adquiridas passam a ser vantagens consolidadas, pois reforçam e dão novos ímpetos às inovações e invenções".

Tratam-se aqui das externalidades e sinergias, da familiarização com os procedimentos e novas técnicas, forças fundamentais no processo de inovação e invenção de produtos e métodos de produção (bens de capital).

Uma sociedade desenvolvida sob o aspecto econômico possui dinamismo que se realimenta também com as renovações, modernizações e melhoramentos dos mesmos produtos, enfim com a capacidade de recriar e reinventar. Com a incorporação de novas tecnologias, inclusive com a utilização de novas matérias primas aprimoradas e desenvolvidas, como acontece com a aplicação da eletrônica na indústria automobilística, aeroespacial, naval, como exemplos, e nos processos produtivos. Um processo que se realimenta, em que se cria e se aprimora, ao mesmo tempo que abre novas fronteiras, como a biotecnologia.

Quanto a mobilidade ilimitada do capital reproduzo o que escrevi em "A ideologia das vantagens comparativas, 5ª Consideração, "A mobilidade do capital", em www.melisiofrota.blogspot.com.br:

"É uma ilusão acreditar em uma mobilidade ilimitada do capital. Os economistas clássicos não analisam os óbices, falam da mobilidade como uma coisa natural e normal que se dá a qualquer tempo (acrescento, e em quaisquer situações). Por isso tudo, não tem sentido pressupor que o país não desenvolveu outras atividades de exportação, que num futuro lhes poderiam ser benéficas, é porque não gozavam das ditas "vantagens comparativas", se assim se quiser chamar. E que aquelas que permaneceram são as que possuem essas vantagens. Trata-se de puro empirismo, sem valor científico, de uma conclusão a posteriori", resultado de uma situação que apenas ajusta os argumentos aos fatos já concretizados, de acordo com suas comodidades.




A SUBSTITUIÇÃO DE IMPORTAÇÕES COMO ETAPA PARA O DESENVOLVIMENTO

Confesso que este é um tópico bastante tormentoso para ser abordado por qualquer estudioso do assunto, porque foi o caminho escolhido e trilhado pelo Brasil ( e por países latini-americanos) para atingir o desenvolvimento econômico, com base nos ensinamentos teóricos dos cepalinos, num momento recheado de aspectos políticos impactantes, com uma riqueza de detalhes impossível de ser prevista por uma teoria econômica, posto que a realidade política nacional e internacional desempenharam papel de relevo.

Tormentoso também porque este processo nunca é adotado em sua pureza, mas vem conjugado com outras medidas que maculam a sua própria natureza.

No caso especificamente do Brasil, embora houvesse a predisposição teórica e política para a adoção do modelo, outras medidas de caráter político foram adotadas em conjunto, de acordo com o cenário político, o que dificulta em demasia uma abordagem mais realista dos seus efeitos, embora predominasse essa perspectiva. Por isso, vou procurar me deter apenas ao aspecto teórico e não a forma concreta, de como ele foi aplicado.

Diante deste desafio e desta dificuldade procuro ficar apenas no plano teórico deste modelo, de modo a avaliar se ele é capaz de levar ao desenvolvimento econômico ou uma etapa necessária para tal.

O meu objetivo é tentar demonstrar teoricamente que o PSI, iniciando-se com a substituição de produtos para o consumo, ao contrário do que se propunha e imaginava, não leva necessariamente ao desenvolvimento. Para isto será necessário um salto de qualidade, que ele é incapaz de gerar.

Potanto, evito entrar em assuntos já bastante comentados, relativos ao PSI, como: concentração de renda, endividamento externo, competitividade, estrangulamento do balanço de pagamentos, efeitos sociais das tecnologias importadas, etc.

No Brasil existe uma gama de estudos sobre esses assuntos, não havendo, portanto, necessidade de repetir os diversos argumentos teóricos sobre o tema, daí a irrelevância de tecer comentários específicos sobre eles e consequentemente sobre a realidade concreta.

Preliminarmente, cabe realçar que outros países adotaram políticas de desenvolvimento que não passaram necessariamente pela adoção do modelo de substituição de importações, tal como foi concebido pelos teóricos da Cepal. E diga-se com relativo sucesso. Portanto, conclui-se que não se trata de uma etapa necessária para alcançar o desenvolvimento.

Bem mais difícil é avaliar se tal modelo traz em si o germe do desenvolvimento econômico. Em outras palavras: se a adoção deste modelo implica necessariamente em desenvolvimento.

Para tanto vou me socorrer de passagens do trabalho "A propósito do chamado processo de substituição de importações", de Paulo de Tarso P.L. Soares, capítulo 12 do livro "Formação econômica do Brasil", Org. José Márcio Rego e Rosa Maria Marques, Ed. Saraiva, 2003, que nos dá um panorama de tudo o que foi dito sobre o assunto, tendo como ponto de partida:

"Lídia Goldeinstein, num livro que reproduz sua tese de doutorado em economia na Unicamp, intitulado Repensando a dependência, acompanha a periodização do clássico Dependência. Em 1950 incicia-se um processo de substituição de importações viabilizado pela empresa multinacional que, tendo consolidado sua expansão nos países centrais, deslocou-se para a periferia, transferindo plantas industriais para os países então chamados de subdesenvolvidos. Tal expansão internacional foi a solução (o grifo é da autora) para os problemas causados pela concorrência interna dos países centrais.

Com grande volume de capitais acumulados, pressionados pela concorrência internacional e contando com enorme estabilidade das instituições financeiras, as empresas nada mais fizeram do que atuar segundo o padrão de competição adequado ao paradigma tecnológico em vigor, o fordismo ( p. 287, os grifos são meus).

O processo de substituição de importações, conforme Maria da Conceição Tavares, em Auge e declínio, não concluiu a montagem do parque industrial brasileiro, tendo-se esgotado na virada dos anos 1950 para 1960. ( p. 287).

O problema principal a ser levantado é se o processo de substituição de importações se esgota e o que significa para os diferentes autores a palavra "esgota".

"Bonelli e Malan, num artigo bastante influente, afirmam que, em meados dos anos 1970, ainda faltava completar o setor de bens de capital. Isso, no entanto, como dependia da forte paticipação das empresas estrangeiras, encontraria sérios problemas, que iam da excessiva desnacionalização da economia brasileira até a incapacidade para solucionar os problemas de balanços de pagamentos (p. 288).

Antônio Barros de Castro, num texto intitulado Ajustamento e transformação: a economia brasileira de 1974 a 1984 (1990), afirma que, depois do II PND, a economia brasileira havia rompido a barreira do subdesenvolvimento. Alexandre Shuwartsman, numa premiada dissertação de mestrado intitulada Auge e declínio do Leviathan: mudança estrutural e crise da economia brasileira, afirma que o II PND é a derradeira onda de substituição de importações porque, depois dele, não serão mais necessárias importações para sustentar a produção corrente" (p. 288).

Do que foi dito, dois pontos merecem destaque: 1) o processo foi comandado por empresas multinacionais; 2) ao que tudo indica, com pequenas diferenças nas ênfases, "esgotar" signifca que cumpriram a sua etapa e missão, quer antes do II PND, quer depois. E que depois disso viria automaticamente a outra fase, no caso a consolidação do desenvolvimento, com um setor de bens de capital dinâmico, propulsor da economia, gerando tecnologia.

Ledo engano. Infelizmente a realidade é mais complexa e daí as dificuldades de encontrar as respostas e soluções adequadas para os problemas correntes. Não restam dúvidas que sempre a análise a posteriori é mais fácil, mas é indispensável fazê-la, sem desmérito para os que procuraram solucionar os problemas.

Na minha opinião, se analisarmos o processo de substituição de importações em sua dinâmica, primeiro com a substituição de bens de consumo, o seu esgotamento só se daria em situações muito específicas, ou melhor a tendência é ele não se esgotar, principalmente se ocorre sob o comando de empresas multinacionais.

O processo de substituição de importações não tem capacidade de criar automática e subsequentemente um um setor produtivo de bens de capital autóctone, de vanguarda, capaz de criar e conceber novos produtos e métodos de produção, mas joga para o futuro esta perspectiva, de que a economia irá engendrar e alavancar este setor, por razões puramente econômicas.

Esta política de substituição de importações, largamente utilizada por paises latino-americanos, notadamente no pós-guerra (no Brasil a partir da década de 30), sob a orientação teórica da CEPAL, não alcança os objetivios almejados.

Em primeiro lugar, porque também relega os fatores sócio-culturais, dando demasiada ênfase aos aspectos econômicos, sem atacar os obstáculos culturais e mesmo econômicos, pois acreditava que a industrialização, por si só, seria capaz de gerar automaticamente o desenvolvimento, como que por um passe de mágica.

Em segundo lugar, o processo de substituição de importações de bens de consumo não se esgota e não passa imediatamente para uma fase dinâmica, notadamente criativa (invenção, inovação, aperfeiçoamento, renovação de produtos e processos produtivos). Não existe motivos e nem razões teóricas para se acreditar nisto.

As padronizações de bens de consumo e de processos produtivos em escala internacional, ditada pelas corporações multinacionais, aliados a um poder financeiro e a um processo bastante dinâmico de introdução de novos produtos no mercado, faz com que o processo de substituição de importações marque passo rumo ao desenvolvimento. Ele está sempre correndo contra o tempo. Ao mesmo tempo ele condicona o aprendizado, dificultando a superação dos obstáculos culturais e econômicos, que são característicos das sociedades não desenvolvidas.

Em terceiro lugar, na maioria dos casos, a substituição de importações se dá (deu) sob o comando das empresas multinacionais, que desempenham um papel fundamental, através de patentes, e que podem ditar o ritmo deste processo, que está condiconado à valorização do capital a nível internacional, obedecendo certas regras ditadas pela dinâmica desta valorização, como a divisão internacional do trabalho, bem como e a forma e o conteúdo da transferência de bens de capital, para citar apenas como exemplos. Convém repetir:

"Em 1950 incicia-se um processo de substituição de importações viabilizado pela empresa multinacional que, tendo consolidado sua expansão nos países centrais, deslocou- se para a periferia, transferindo plantas industriais para os países então chamados de subdesenvolvidos".

Encontramos em Celso Furtado (sempre é bom citá-lo), "A nova dependência", Ed. Paz e Terra, 5ª ed, 1983, trechos que dão ênfase ao que venho querendo explicar:

"No período que se seguiu a segunda guerra mundial essa industrialização dirigida exclusivamente ao mercado interno teve o concurso crescente das empresas transnacionais. Utilizando tecnologia e , em muitos casos, equipamentos já amortizados, essas empresas puderam contornar as dificuldades criadas pela estreiteza dos mercados, que então começava a apresentar-se. Se é verdade que as transnacionais tiveram que realizar um esforço de adaptação a mercados estreitos e ainda em formação, não o é menos que elas em seu natural empenho em maximizar a rentabilidade de seus investimentos fizeram de tudo para que os mercados em que se instalavam se adaptassem o mais possível aos padrões de consumo que prevaleciam nos países centrais. Vimos que nestes as empresas transnacionais operavam no sentido de homogeneizar os mercados nacionais, pois isso lhes permitia maximizar as vantagens derivadas das economias de escala e do controle da inovação. Nos países periféricos a homogeneização era condição necessária para o uso de tecnologia e/ou equipamentos amortizados" (grifos meus, p. 122).

Diga-se de passagem que estes problemas de padronização e de transferência de tecnologia ultrapassada, obsoleta ou amortizada, como queiram, estão associados a diluição do risco dos empreendimentos.

Entretanto, não é difícil concluir que, nestes casos, estes procedimentos não impulsionam a economia rumo ao desenvolvimento, mas reforçam o processo de centralização de criação e desenvolvimento de novos produtos e processos nos países centrais. Na verdade trata-se de uma sangria de recursos, onde se compra gato por lebre. Pois, retardam a introdução de novas tecnologias, de acordo com as conveniências das empresas transnacionais.

Então o problema que se coloca não é que faltava completar o setor de bens de capital, porque o setor de bens de consumo já tinha se esgotado e o passo seguinte seria o processo de substituição de importações de bens intermediários e de capitais. O processo é dinâmico, não para, não se esgota, requer transformação o tempo todo. O capitalismo é impulsionado pela busca do novo.

Ou seja, a lógica de valorização do capital a nível internacional, comandado por empresas multinacionais, não permite supor nem imaginar que elas estão interessadas no desenvolvimento, exercendo um papel fundamental para que ele se concretize. Em alguns momentos podem até auxiliar, mas em geral são entraves.

Dependendo da dinâmica e da velocidade de introdução de novos produtos e processos produtivos, em escala internacional, irá ocorrer a obsolecência técnica e tecnológica, dos bens produzidos nos países subdesenvolvidos. Não precisa ir longe para perceber que muitos dos produtos fabricados nos países subdesenvolvidos, mesmo por empresas multinacionais, sofrem de defasagem tecnológica, em relação a produtos similares, concebidos e produzidos nos países centrais.

Foi efetivamente o que aconteceu no II PND. Nas palavras de Lídia Goldenstein:

"Lídia Goldenstein, em Repensando, também concorda que a culminação da montagem do parque industrial, com o II PND, não significou liberdade para o crescimento da economia brasileira. A razão para tanto é a de que o II PND cristalizou-se numa posição tecnológica atrasada. O mundo estava passando por uma verdadeira revolução tecnológica, produtiva e financeira, que tornava obsoleto o nosso padrão de industrialização.

As bases materiais do mundo foram transformadas em menos de vinte anos. A infra- estrutura fornecida pelo desenvolvimento das tecnologias de informação (micreeletrônica, informática, telecomunicações), em torno das quais foi surgindo uma enorme gama de descobertas (biotecnologia, novos materiais, laser, energias renováveis, etc), permitiram a transformação da e economia mundial em um espaço único de prodção e troca.

A revolução tecnológica que está ocorrendo inaugurou um novo estilo de desenvolvimento, baseado em novas formas de produção e administração, no qual o motor da acumulação não é mais o lançamento de novos blocos de investimentos, mas a inovação sistêmica. ... Exige-se, hoje, mão-de-obra qualificada, cérebros e infra- estrutura organizacional dificilmente encontráveis na maior parte dos países.

O II PND leva ao limite um determinado padrão de financiamento. A deixar privilegiar velhos setores, a dificuldade para disciplinar o processo de acumulação de capital rompendo com interesses estabelecidos" ( p. 290).

Neste sentido, forçoso concluir que o II PND não se deu como uma consequência lógica do processo de substituição de importações, que numa primeira fase se esgotou, nos dizeres dos estudiosos sobre o assunto.

O II PND se deu por força de uma situação de extrema gravidade, ou seja, pela necessidade de fazer frente a uma crise econômica internacional, que viria mudar diversos paradigmas políticos, econômicos e sociais.

A necessidade de se lançar um II PND, em tal situação, novamente com a participação ativa e discricionária do Estado, para os setores de bens intermediários e de capitais, nos mostra que não existem etapas que se esgotam e que espontânea e necesserariamente nos levariam a outras etapas, rumo ao desenvolvimento econômico.

E mesmo com a industrialização dos setores de bens de capital e intermediários não significa que o país havia alcançado o desenvolvimento econômico, no sentido que aqui damos e que os economistas supunham.

É prematuro, precipitado, analisar a pauta de importações e concluir, através da constatação de uma grande movimentação, que o parque industrial para estes bens estava consolidado e que, por isso, o país havia alcançado o desenvolvimento. Nada sabíamos sobre a qualidade, o nível de tecnologia embarcado nos produtos, a complementariedade dos bens importados e as externalidades. E pouco se consegue ver além do horizonte.

A tecnologia já amortizada, ultrapassada ou obsoleta tecnologicamente estimula ainda mais a critividade, a invenção, a inovação nos países exportadores (centrais), sem solucionar os problemas dos importadores. Além de não gerar competividade a nível internacional, os agentes terão que se familiarizar com estas tecnologias defasadas, com elevado custo social.

E se ela se deu através de empresas transnacionais a probabildade de ter ocorrido uma importação de bens obsoletos aumenta em demasia. Por isso, não tínhamos elementos suficientes para chegar a tal conclusão otimista.

E ao que tudo indica a cadeia ascendente do setor de bens de produção é mais complexa do que parece a primeira vista. E além disto, existe o setor de bens de capital que produz bens de capital para o setor de bens intermediários, setor este bastante dinâmico, que caminha a passos largos.

Não basta importar bens de capital e criar expectativas de que tudo se resolve, como que por um passe de mágica. Não existe este "Deus ex-machina". Por trás da tecnologia, existem aspectos fundamentais das relações humanas, formais e informais, todo um sistema cultural, educacional, estrutura e cultura organizacional, resistências sociais à mudança, disciplina, compromissos, técnicas de comercialização, mudanças de hábito e atitudes, indispensáveis e adequadas ao seu funcionamento.

Cito passagens do livro "A máquina que mudou o mundo", de James P. Womack, Daniel T. Jones & Daniel Roos, Ed. Campos, 2ª ed, 1992, sobre as mudanças da produção em massa no setor automobilístico:

"A questão óbvia: como isto é possível? Dos resultados de nossas pesquisas e visitas às fábricas, chegamos à conclusão de que as fábricas de lata tecnologia mal organizadas acabam adicionando tantos técnicos indiretos e pessoal de manutenção extra, quantos trabalhadores diretos são removidos das tarefas manuais de montagem.

Ainda mais, ela tem dificuldades para manter um rendimento elevado, pois colapsos na complexa maquinaria reduzem a fração do tempo total de operação, em que a fábrica está realmente produzindo veículos. Observando a avançada tecnologia robótica em várias fábricas, chegamos a um axioma simples: a organização enxuta precisa anteceder a automação de alta tecnologia de processos, se a companhia deseja desfrutar plenamente dos benefícios" (grifos meus, p. 85).

"Isso, por sua vez, implica em trabalho de equipe na linha de montagem e um sistema simples, mas abrangente., de disseminação de informações possibilitando qualquer um na fábrica responder rapidamente aos problemas e conhecer a situação global. Nas antiquadas fábricas de produção em massa, os gerentes escondiam informações sobre as condições da fábrica, por verem em tal conhecimento a chave para seu poder.

... A seguir, é preciso que adquiram qualificações adicionais: reparos simples de máquinas, controle de qualidade, limpeza e solicitações de materias. É preciso, ainda, que sejam encorajados a pensarem ativamente - de fato, proativamente, de modo a encontrarem soluções antes que os problemas se tornem fraves" (p. 89).

E quanto as relações formais e informais na empresa:

"Em contraposição, numa série de fábricas-modelo da General Motors, encontramos em vigor novo contrato coletivo, e todo o aparato formal da produção enxuta. Entretanto, alguns minutos de observação revelaram que pouquíssimo trabalho de equipe realmente ocorria, e que o estado de ânimo na fábrica era bastante baixo.

Como explicar estas aparentes contradiçoes? É simples: os operários da Ford tinham grande confiança na gerência da planta, que não poupara esforços, no início dos anos 80, para assimilar os princípios da produção enxuta. ... Nas fábricas da GM, ao contrário, constatamos que os trabalhadores pouquíssimo confiavam na capacidade da gerência em lidar com a produção enxuta. Não era de admirar, já que o enfoque da GM no início dos anos 80 fora descobrir tecnologias avançadas para se livrarem dos trabalhadores.... Em tais circunstâncias, não surpreende que o comprometimento dos altos escalões da corporação, bem como do sindicato, não tivessem tido ressonância no chão da fábrica" (p. 90).

A importação de tecnologia e os efeitos sociais que ela acarreta é assunto bastante polêmico, parece não existir qualquer consenso entre profissionais, e nos remete à questão da neutralidade tecnológica.

Aos nossos propósitos, seria suficiente destacar que processos produtivos nem sempre são simplesmente incorporados e assimilados em diferentes condições sociais. O caso do Japão é emblemático.

Depois de diversas tentativas para incorporar e assimilar o modelo "fordismo" de produção, largamente utilizado nos E.U.A., em condições extremamente peculiares, mão de obra formada por imigrantes de diversas origens que mal falavam o inglês, o Japão finalmente não o adotou em suas fábricas automobilísticas, por razões dentre as quais: 1) mercado doméstico limitado, com grande variação de modelos; 2) uma mão de obra mais organizada, que não era formada por imigrantes temporários; 3) um pacto de emprego vitalício e remunrações com base no tempo de serviço, que limitava o turnover; 4) limitação de recursos naturais que influia na especificação dos produtos e a necessidade de evitar desperdícios; 5) dificuldades econômicas para importar tecnologia em grande escala em um país devastado pela guerra (Womack, p. 41).

Enfim, na fase atual do capitalismo, a criatividade, o empreendorismo, a inovação, a invenção são também, ou principalmente, fatores psico-sociais que requerem aprendizagem, orientação, instituições educacionais, amparo institucional (setor de pesquisa e desenvolvimento avançado, apoio financeiro), infraestrutura, externalidades, coordenação e um estímulo do meio social que condicionam a mentalidade dos indivíduos para um novo modo de pensar, de encarar o futuro sob uma perspectiva diferente. E estes estímulos não são apenas econômicos e financeiros.

No caso do Brasil, não é que não foram tomadas iniciativas, mesmo que esporádicas, até mesmo em setores estratégicos, visando o desenvolvimento econômico. Longe disso.

Entretanto, faltou uma integração e coordenação global entre os diversos setores econômicos, que abrangessem também os aspectos sócio-culturais, como um todo abrangente, atacando as vulnerabilidades e explorando as potencialidades. O foco era a industrialização a todo custo, que iria resolver o problema do desenvolvimento, por etapas.

A prova disto é que, numa segunda etapa, foi necessária mais uma vez a mão do Estado para implementar o setor de bens de capital e intermediários.

Sem falar na necessidade de vencer os receios que um empresário nacional sente em ter que se defrontar com uma corporação multinacional com enorme poder financeiro, que já está estabelecida no mercado internacional.

Por isso, não causa estranheza que produtos similares produzidos nos países subdesenvolvidos careçam de um nível de qualidade comparados aos produzidos nos países centrais.

Não bastasse isto, ainda podemos citar como entraves os aspectos políticos e culturais, associados a uma ideologia desenvolvimentista populista, que não encoraja a competitividade, distorceram os objetivos de uma política para o desenvolvimento, com uma proteção duradoura e exacerbada a setores com influência política, frente a concorrência internacional.

E dando seguimento a este assunto, nunca é demais lembrar que os investimentos estatais, em empresas públicas e de economia mista, foram administrados por apadrinhados políticos, que pouco se interessavam e não tinham quaisquer compromissos com os aspectos ligados ao desenvolvimento.

Em resumo, passar de uma etapa de substituição de importações de bens de consumo para um estágio de desenvolvimento econômico requer um salto de qualidade, que o primeiro, por si só, é incapaz de gerar.

Termino este tópico citando:

"O problema fundamental do processo de substituição de importações, na versão acima exposta, está na produção da tecnologia importada, na ausência de desenvolvimento tecnológico autônomo, em suma, na dependência tecnológica. Tecnologia é a solução para problemas práticos e imediatos. Nos países industrializados a dotação de fatores e a constelação de recursos naturais são diferentes da que prevalece nos paíeses da América Latina, onde vigorou o processo de substituição de importações" (Tarso, p. 286).


CONCLUSÃO

Neste breve artigo procurei expor como o livre comércio conjugado com a teoria das vantagens comparativas não são capazes de gerar o processo de desenvolvimento econômico de um país.

Os fatores ligados ao desenvolvimento econômico não dizem respeito apenas a aspectos econômicos da sociedade, mas estão associados a fatores sociais mais profundos, dos quais a economia é apenas um destes.

Um projeto de desenvolvimento econômico para apresentar resultados satisfatórios tem que ser concebido de forma mais abrangente, levando em consideração valores sociais arraigados na mentalidade da população, alterando concomitantemente e em sintonia tanto os valores culturais que repercutem nas variáveis econômicas, quanto a dinâmica da própria economia.

Ao mesmo tempo, deve-se atacar as vulnerabilidades e explorar as externalidades da economia de forma coesa, impossíveis de serem viabilizadas por comportamentos e atitudes exclusivamente individualistas, que almejam o lucro momentâneo.

O "fracasso" do processo de substituição de importações em não alcançar os objetivos esperados não valida a teoria do livre comércio como a alternativa viável ao processo de desenvolvimento econômico.

Esta teoria liberal deita raízes na concepção largamente divulgada por estudiosos de que o surgimento do capitalismo se deu em virtude de um incremento na circulação de mercadorias, principalmente com as "cruzadas", tese esposada por Leo Huberman em "A história da riqueza do homem".

De minha parte, analisando esta situação com base nos ensinamentos de Marx, acho pouco provável que o incremento na circulação de mercadorias fosse suficiente para produzir profundas alterações na estrutura produtiva dos países, gerando o surgimento do capitalismo.

Acredito que ocorreram profundas transformações sociais, com medidas políticas, que repercutiram sobre o modo de produção e que possibilitaram o incremento da circulação de mercadorias, que por sua vez trouxe um estímulo à produção, mas que esta (circulação) não desempenhou um papel determinante nas transformações do modo de produção vigente, para o capitalismo. Se assim fosse, caberia às cidades "italianas" renascentistas um papel primordial neste processo. E os demais países que compartilharam o comércio também teriam avançado neste processo.

Como procurei demonstrar, o processo de desenvolvimento econômico é extremamnete complexo e requer para o seu sucesso, tanto medidas econômicas, como políticas e sociais.

Assim sendo, o desenvolvimento econômico não se dá como um simples reflexo do dinamismo das sociedades mais desenvolvidas. Esta concepção foi cara tanto a Marx quanto a Trotsky, que acreditava que pela teoria do "desenvolvimento desigual e combinado" seria possível os países atrasados alcançarem o estágio de desenvolvimento econômico atingido pelas economias centrais, queimando etapas.

Hoje com a internacionalização da economia, em que os valores e costumes sociais são padronizados a nível internacional, por empresas multinacionais, veiculados pela mídia, com a segmentação das atividades produtivas em diversos países, fica claro que as medidas necessárias à transformação tornam-se mais difíceis de serem implementadas. O jogo político desempenha um papel de grande relevo.

Que o liberalismo não é a via e nem mesmo uma alternativa para se alcançar o desenvolvimento econômico nos mostram a Alemanha e o Japão, que sob a liderança de Bismarck e a revolução Meiji imprimiram políticas de desenvolvimento econômico contrárias ao livre comércio e alcançaram os seus propósitos. O mesmo se aplica aos significativos avanços da Coréia e ao Japão pós-guerra.

Para finalizar este artigo, cito passagens do livro de José Luiz Fiori, a quem me alinho neste momento:

"Mas foi só na Alemanha, no século XIX, que se formulou uma teoria e uma estratégia nacionalista consistentes de desenvolvimento econômico, a partir de objetivos geopolíticos explícitos.

É neste contexto de atraso, cerco e ressentimento-nacional que se deve situar a permanente preocupação defensivo-expansionista da Alemanha, dentro de um espaço vital supranacional a ser conquistado e preservado. É neste contexto também que se deve situar o intense commitment de suas elites civis, militares e intelectuais, que teve papel decisivo no desempenho econômico do nacionalismo alemão" ("Nacionlismo e Desenvolvimento econômico", em "História, Estrat. e Desenvolvimento", Boitempo editorial, 2014, p. 77/8)

Por tudo o que foi dito, podemos conclui que a teoria econômica do liberalismo é um paradoxo, com conotações ideológicas, pois vai de encontro a realidade dos fatos.


















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